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MUDAR O JUDICIÁRIO
Os debates acerca da necessidade de uma reforma do Poder
Judiciário, que não são novos, começam a ganhar um pouco mais de
concretude com a iniciativa do governo de apresentar um projeto de modificações na área da Justiça. Em
maio, foi criada, no âmbito do Ministério da Justiça, uma secretaria
voltada especificamente para a reforma do Judiciário, cujo titular, Sérgio
Renault, tem coordenado uma série
de discussões sobre o tema.
Como atesta um profícuo debate
promovido por esta Folha com a presença do próprio Renault e de renomados especialistas -publicado
nesta edição-, embora haja divergências importantes sobre pontos da
reforma, há significativa concordância em relação a aspectos relevantes.
Há, já de início, o consenso de que
as deficiências do Judiciário traduzem-se num grande problema que a
todos afeta: a extrema morosidade
da prestação jurisdicional. Diversas
causas explicam a lentidão. Elas vão
desde questões ligadas à gestão, que
precisa ser modernizada e informatizada, a problemas relativos ao caráter da Justiça adotada no país.
Parece haver concordância em que
é excessivamente formalista nossa
legislação processual e que vige no
Judiciário um sistema irracional de
recursos. Apenas neste ano, chegaram ao Supremo Tribunal Federal, a
corte máxima do país, cerca de 140
mil recursos. O mais grave é que, segundo o ministro Carlos Velloso,
90% deles apresentam temas redundantes, e a maioria teve origem no
poder público. São os próprios governos os que mais apostam na morosidade da Justiça -e a alimentam- para postergar decisões. Sem
prejuízo do direito de defesa, é preciso conter essa protelatória indústria
de recursos.
Apesar de controversa, a idéia da
"súmula vinculante" também mereceria ser considerada na reforma. A
proposta aqui é que certas decisões,
em razão de sua repetição, conexão e
coerência, sejam resumidas por tribunais superiores para que a elas se
vinculem os casos assemelhados, o
que aliviaria o tempo despendido na
apreciação de causas repetitivas com
desfecho previsível. Ainda que possa
significar um certo engessamento do
processo decisório, a vantagem
quanto à agilidade parece clara. Certamente, se um mecanismo como
esse vier a ser adotado, será necessário criar brechas para que a Justiça se
torne pelo menos permeável a novas
argumentações, evitando um enrijecimento excessivo.
Mais polêmica é a proposta de um
controle externo do Judiciário. Apesar de respeitáveis opiniões em contrário, parece cada vez mais difícil
descartar a necessidade de algo nesse
sentido. Vale observar que os dois
outros Poderes -o Executivo e o Legislativo- já se submetem ao controle direto dos cidadãos através do
voto. Não será fácil, contudo, encontrar uma fórmula aceitável que seja
democrática e aplicável a todos os tribunais do país. É preciso ainda cuidar para que o controle externo não
acabe submetendo o Judiciário à excessiva influência de advogados e de
membros do Ministério Público, que
são parte em processos.
O debate está aberto, e é necessário
que prossiga. Render-se às dificuldades e deixar tudo como está significará renunciar ao sonho de um Brasil
com uma Justiça mais célere, precisa
e imparcial.
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