São Paulo, domingo, 18 de julho de 2004 |
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A porta-bandeira e o mestre-sala
PAULO RABELLO DE CASTRO
Os brasileiros com capacidade de pensar e decidir -os adultos deste país- têm uma obrigação com as gerações que percorrerão o espaço deste século neste território. Não podemos continuar sendo a nação que exporta seus filhos para morrerem desidratados na fronteira desértica entre o México e os EUA, na tentativa de lá "arriscarem uma oportunidade" de trabalho que aqui lhes foi suprimida pela cristalizada burocracia, pelo descontrole dos entes estatais, pelo peso da dívida interna, pelo acúmulo dos direitos constitucionais incumpríveis porém sagrados, pela corrosiva aliança entre os que votam a Constituição em nome de todos e os privilégios da minoria agraciada pelos mimos do Estado pré-falimentar. Não é de lipoaspiração que a grande dama carece. Ela precisa ser salva do coma por um recondicionamento físico completo, com direito a RPG, pilates, dieta balanceada e terapia anticompulsiva. É de uma profunda revisão constitucional que carecemos. Como prosseguir, por exemplo, com as estioladas leis trabalhistas apensas ao texto constitucional? Mais brasileiros e brasileiras estarão tentando virar americanos ilegais mesmo sob o risco de morrerem de sede na travessia do deserto... E o que dizer do peso da máquina do Estado, grande embarcação encalhada pela multiplicação das carreiras públicas intocáveis, dos direitos inamovíveis e das vantagens "imexíveis"? Quem a tudo financia é o chicote tributário das contribuições ditas sociais, cuja multiplicação indiscriminada, sempre acolitada pela desculpa da assistência aos carentes, guarda relação direta com a perda de vitalidade do crescimento, a partir dos anos 80, inaugurando a era do grande desemprego aberto no país. Porém nada na atual Constituição se compara ao casuísmo previdenciário a ela pendurado pelas regras esdrúxulas dos regimes geral e próprios, em que impossíveis direitos são erguidos à condição de cláusulas escritas em pedra, justamente no campo mais sujeito à imprevidência do Estado, que não só não poupa o que deveria verter em benefícios de aposentadoria no futuro, como faz pior: enterra as gerações futuras com uma administração temerária de juros sobre juros, sobre seu imenso passivo mobiliário. Quer saber? A essa altura, antes de pensar em plástica da porta-bandeira, a arquibancada do Brasil bem que poderia começar a protestar ao mestre-sala e ao presidente da escola por uma troca de samba-enredo. Paulo Rabello de Castro, 55, doutor em economia pela Universidade de Chicago (EUA), é vice-presidente do Instituto Atlântico. Escreve às quartas-feiras, a cada 15 dias, na seção "Opinião Econômica", do caderno Dinheiro. Texto Anterior: TENDÊNCIAS / DEBATES Eduardo Moacyr Krieger: Saber integrado no hospital universitário Próximo Texto: Painel do Leitor Índice |
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