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ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES
Uma lição a ser observada e aprendida
Já citei várias vezes o livro de Michael T. Klare no qual o autor defende com todas as letras que o mundo moderno está fadado a conviver
com guerras violentas devido à escassez de recursos naturais, em especial
de recursos energéticos ("Resources
Wars", Henry Holt and Company,
Nova York, 2002).
Até aqui, as guerras estiveram distantes de nós, pelo menos geograficamente. Mas o quadro está mudando.
Os tumultos sociais começam a bater
às nossas portas. Esse é o caso da Bolívia, que completa mais de um mês de
agitação popular, com tristes perdas
humanas.
O motivo é o mesmo -recursos naturais. O povo boliviano não quer que
seu país exporte gás para os Estados
Unidos. E por que estes insistem nessa
transação? Porque a economia mais
forte do mundo está se mostrando frágil e vulnerável na área energética.
No caso em tela, os Estados Unidos
possuem apenas 3% das reservas de
gás do mundo, o que daria para míseros oito anos do consumo. Isso não é
nada para as imensas necessidades
daquele país. Com essa situação tão
dramática, os Estados Unidos não podem dispensar nenhuma pequena reserva de gás, em qualquer parte do
mundo.
Mesmo considerando as reservas
não existentes -mas que os cientistas
vêem como passíveis de serem descobertas e utilizadas-, os americanos
terão apenas 5% do gás mundial, aliás,
o mesmo montante da América do
Sul, onde a Bolívia e a Argentina concentram a maior parte ("Are We Running Out of Crude Oil and Natural
Gas?", PetroStrategies Inc., 2003).
Em termos mundiais, estamos falando de migalhas, pois só o território
da ex-União Soviética dispõe de 38%
de reservas efetivas e 41% com possibilidades de serem descobertas. No
Oriente Médio, são 35% e 18%, respectivamente.
Assim como a disputa do gás ensejou agora um conflito interno na Bolívia, ela pode provocar novos conflitos
internacionais, como ocorreu no Iraque, onde as armas de destruição em
massa nunca apareceram.
A guerra pelos energéticos é a guerra
mais cara de todos os tempos. Só na
última década, as maiores empresas
petrolíferas gastaram a estonteante cifra de US$ 260 bilhões para simplesmente manter a produção atual. Para
aumentar a produção, elas precisam
investir mais e, como condição, não
podem descuidar da eficiência e dos
lucros. Por isso, recolher um gás que
está pronto para ser transportado
-como o da Bolívia- é um negócio
da China.
Para o Brasil, o que está ocorrendo
no mundo nos ensina uma lição. Afinal, nós também recebemos gás da
Bolívia, que foi contratado por 30
anos. Mas as condições desse contrato
serão renegociadas periodicamente.
Aliás, estamos entrando nessa fase.
Será que, com toda essa pressão, conseguiremos manter uma posição vantajosa? Não seria o caso de intensificarmos ainda mais as explorações
dentro do nosso imenso país? E de explorarmos as fontes alternativas e
não-poluentes de energia (hídrica e
outras) que aqui abundam?
Antônio Ermírio de Moraes escreve aos domingos nesta coluna.
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