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ANTONIO DELFIM NETTO
Doha x Brasil
O SENHOR PEDRO de Camargo Neto é um profissional
de coragem e competência
reconhecidas no setor agrícola. Em
excelente entrevista dada à revista
"Veja" (13/8/08), ele talvez tenha
sido um pouco rigoroso na apreciação do papel desempenhado pela
diplomacia brasileira.
Ao contrário, entretanto, de outros críticos doidivanas pendurados em princípios que pensam
científicos, mas que mal disfarçam
sua ideologia, ele disse uma verdade muito dura e dolorosa que não
tem nada a ver com o Itamaraty.
Tem a ver com o Brasil.
Em resposta à pergunta "o que
significa o fracasso de Doha?", o senhor Camargo Neto ponderou:
"Não é nenhuma tragédia. No Brasil, houve uma glamourização do
tema. Doha ganhou importância
desproporcional ao seu alcance.
Durante as negociações, a culpa
pelas mazelas agrícolas brasileiras
foram convenientemente depositadas sobre o protecionismo dos
países ricos. Nos últimos cinco
anos, Doha foi vista como uma espécie de remédio mágico contra as
doenças endêmicas do agronegócio. Esse simplismo prestou-se a
esconder deficiências internas
muito piores que os efeitos do protecionismo dos países ricos".
Seu exemplo numérico é definitivo: se erradicasse a febre aftosa, o
Brasil poderia elevar em dez vezes
a sua exportação de carne suína em
relação à oferta da União Européia
apresentada em 2002...
Trata-se de um problema trágico. A doença chegou até nós em
1895, importada junto com reprodutores europeus. Tem sido combatida, intermitentemente, sem o
necessário vigor e continuidade,
desde o início dos anos 60 do século passado. Em 2002/04, parecia
completamente eliminada.
Infelizmente remanescem focos
que têm servido para destruir a
imagem da pecuária brasileira
-hoje a mais importante exportadora mundial, mas que ainda é 40%
clandestina em relação aos controles fiscal e sanitários internos.
Em 2005, quase 50 países estabeleceram restrições às nossas exportações, resultado da irresponsabilidade de alguns pecuaristas,
abatedores e frigoríficos combinada com a de nossas autoridades,
que até agora foram incapazes de
construir o sistema crível de controle sanitário e rastreamento que
prometemos aos importadores. A
sobrevivência e ampliação de nossas exportações no longo prazo dependem do cumprimento dessa
promessa, pois é grave miopia continuar a pensar que no longo prazo
apenas o Brasil será capaz de ampliar a oferta de carnes ao mercado
mundial.
Tem razão, portanto, o senhor
Camargo Netto: esqueçamos as dores de Doha e tratemos de curar os
males que dependem de nós.
contatodelfimnetto@uol.com.br
ANTONIO DELFIM NETTO escreve às quartas-feiras
nesta coluna.
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