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CARLOS HEITOR CONY
Tanto faz
RIO DE JANEIRO - Ao contrário de
Maiakóvski, prefiro morrer de tédio a
morrer de vodca. Aliás, nem prefiro
morrer de uma forma ou de outra,
mas não abomino o tédio.
Nietzsche fez o elogio do ócio, Erasmo, o da loucura. Não farei o elogio
do tédio, mas ele tem o seu lado bom.
Dá a impressão de que já tivemos tudo, que nada nos falta e que tanto faz
Lula ou Serra ganharem ou perderem, tanto faz Bush destruir o Iraque,
tanto faz o filme nacional que vai
concorrer ao melhor filme estrangeiro na Academia de Hollywood ser
garfado mais uma vez por uma produção alienada e comprometida com
o Consenso de Washington.
Tenho ouvido muito este ""tanto
faz" aplicado aos dois candidatos do
segundo turno. Gente de todos os segmentos e origens, quando se manifesta sobre isso ou sobre aquilo, logo no
início deixa claro: ""Tanto faz Lula ou
Serra ganhar, o novo presidente, seja
ele quem for, terá de...".
Donde posso concluir que os problemas, os desafios, todos os nós que entravam o progresso econômico e social do Brasil são tais e tantos que
tanto faz elegermos fulano ou sicrano. Seremos governados pelos nossos
problemas, pelas nossas carências,
pela nossa inércia.
Certa vez, perguntaram a um filósofo pré-socrático o que ele preferiria
ser: rabo de leão ou focinho de porco?
O filósofo pensou, pensou, abriu um
atalho na pergunta: ""Não há uma
terceira opção?". Não, não havia.
Voltou a pensar, pensar, avaliou o
rabo do leão e o focinho do porco, finalmente respondeu: ""Tanto faz".
Citei nesta crônica o poeta Maiakóvski, Nietzsche, Erasmo, Bush, Lula, Serra e um filósofo pré-socrático.
Poderia ter citado mais gente, Enéas,
Drummond, Raul Seixas, Barbalho
ou o bispo Macedo. Daria na mesma.
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