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TENDÊNCIAS/DEBATES
O programa brasileiro de combate à Aids dá a devida atenção aos homossexuais?
SIM
A Aids não é uma doença dos outros
MARIÂNGELA BATISTA GALVÃO SIMÃO e EUCLIDES AYRES CASTILHO
EMBORA A epidemia de Aids no
país tenha surgido entre homossexuais, ao longo do tempo ela
atingiu outros segmentos da população, exigindo do governo e da sociedade civil uma resposta ampla.
O Brasil constitui um exemplo de
que focar o combate à epidemia da
Aids apenas em grupos específicos
não é suficiente para o enfrentamento do problema.
A visão abrangente do contexto da
epidemia resultou na redução do número de infecções estimadas para o
Brasil. Em meados de 1990, o Banco
Mundial previu que, no ano 2000, o
Brasil teria 1,2 milhão de pessoas vivendo com o HIV. Mais de 15 anos depois, a estimativa é de metade desse
número -uma mostra de que a estratégia brasileira tem sido acertada.
Dados indicam claramente que a
doença atinge todos os segmentos da
população, alguns mais do que outros.
Os números mais recentes, inclusive,
apontam maior crescimento em mulheres heterossexuais. Na última década de 80, existiam no país 26 homens com Aids para cada mulher.
Hoje, a razão é de 16 homens para 10
mulheres.
É importante ressaltar que esse incremento se deu, principalmente, por
transmissão heterossexual (97,3%
dos casos notificados, em 2006, entre
mulheres acima de 13 anos).
Apesar de a epidemia ter mudado
de perfil ao longo dos anos, os homossexuais sempre foram prioritários para o Ministério da Saúde.
Estudos indicam que a taxa de incidência da doença é 11 vezes maior em
gays em relação à população geral
-um dado que fala por si só e que reforça a importância da manutenção
de políticas específicas para esse segmento populacional.
Com base nessa situação, o Ministério da Saúde lançou, recentemente,
o Plano Nacional de Enfrentamento
da Epidemia de Aids e DST entre
Gays, Homens que Fazem Sexo com
outros Homens e Travestis, o qual
fortalece o Programa Brasil Sem Homofobia e a política pública de prevenção e controle das infecções sexualmente transmissíveis e da Aids.
O plano foi resultado de um reconhecimento de vulnerabilidades específicas, que contribuem para que
esses segmentos sejam mais sujeitos
à infecção pelo HIV.
Além disso, produziram-se campanhas e materiais educativos específicos para o público gay.
Em 2002, uma emblemática campanha de massa, que incluía TV e peças gráficas, foi muito bem recebida
pelo público-alvo; porém, desafortunadamente, vista com preconceito
por outros setores da sociedade.
Em 2007, uma campanha de TV
trazia os gays como foco, novamente,
para as ações estratégicas.
Em 2008, peças educativas foram
distribuídas em boates gays e algumas organizações da sociedade civil.
Por derradeiro, a resposta à pergunta é: sim, o programa brasileiro de
Aids dá a devida atenção aos homossexuais. Todavia, direcionar o enfrentamento da epidemia somente aos
homossexuais seria um retrocesso.
Representaria uma volta à concepção
de que a disseminação do vírus da
Aids se restringe a determinados subgrupos populacionais. A Aids não é
uma doença dos outros!
MARIÂNGELA BATISTA GALVÃO SIMÃO, 52, médica
pediatra e sanitarista, mestre em saúde materno-infantil
pelo Instituto da Saúde da Criança da Universidade de
Londres (Inglaterra), é diretora do Programa Nacional de
DST e Aids do Ministério da Saúde.
EUCLIDES AYRES CASTILHO, 66, médico epidemiologista, professor titular da Faculdade de Medicina da USP, é membro da Comissão Nacional de Aids, do Comitê de Assessoria Técnica sobre HIV e Aids da Organização Panamericana de Saúde e consultor do Unaids (Programa Conjunto das Nações Unidas para HIV e Aids).
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
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