São Paulo, quinta-feira, 22 de junho de 2006

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Relatório disperso

Texto da CPI dos Bingos não traz fato novo, o que é um problema para uma comissão que tem poder especial de investigação

O DOCUMENTO aprovado anteontem como relatório final da CPI dos Bingos é uma ode à dispersão. São 1.430 páginas e um índice que abrange das legislações sobre os jogos de azar à máfia do lixo em Ribeirão Preto, do caso GTech à corrupção na Prefeitura de Santo André, das loterias estaduais ao assassinato do prefeito de Campinas. Como sucede aos que miram em todas as direções, passa longe de desferir um tiro certeiro -não dá nenhum passo importante na investigação dos desmandos.
As dúvidas ainda em curso sobre a morte de Celso Daniel, ex-prefeito petista de Santo André, sem dúvida constituem capítulo mais rumoroso que filigranas sobre o problema dos bingos na América Latina. Nem por isso o progresso no que tange às motivações do assassinato foi consistente. A suposta atuação do ex-ministro José Dirceu e de Gilberto Carvalho, assessor do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no esquema de propina que pode guardar relação com o caso continua tão obscura como antes. Dirceu e Carvalho acabaram excluídos da lista de indiciados.
Entre as 83 pessoas físicas e jurídicas indiciadas no relatório da CPI, registrem-se o caso do presidente do Sebrae, Paulo Okamotto, e o do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci Filho.
Envolvido no pagamento de uma dívida nebulosa de Lula, de quem é amigo, Okamotto continua devendo esclarecimentos. Palocci ainda tem muito a explicar sobre seu período na Prefeitura de Ribeirão Preto e sobre a escandalosa quebra de sigilo do caseiro Francenildo Costa. Mas essas afirmações já se transformaram em platitudes -os trabalhos de uma CPI, com poderes extraordinários de investigação, deveriam proporcionar avanços.
Do ponto de vista judicial, um indiciamento de comissão parlamentar significa pouco. Equivale a apontar suspeitas para posterior investigação. Se o Ministério Público e a Polícia Federal não considerarem consistentes as acusações, os indiciamentos terão sido em vão. Quando faltam objetividade e produção de provas sólidas e inéditas, há pouca chance de o inquérito prosperar no sentido da desejada punição.
Resta à CPI o efeito político. As comissões têm o grande mérito de concentrar a atenção da opinião pública durante os inquéritos. Contribuem assim para enfatizar a gravidade do problema e vivificar a necessidade de cobrança. Mas o mesmo espírito de cobrança que suscitam a respeito dos esquemas de corrupção deve ser exercido sobre comissões que pouco avançam na descoberta de fatos novos. Às CPIs, a Constituição confere um grande poder de investigação, o que tem faltado em seus trabalhos.


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