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CARLOS HEITOR CONY
Dercy
RIO DE JANEIRO - Entre as coisas estranhas que me aconteceram,
a mais complicada e inútil foi a de
superintender a teledramaturgia da
antiga Rede Manchete, que então
atravessava boa fase, com produções de sucesso, como "Marquesa
dos Santos" e "Dona Beja". Em conversa com Adolpho Bloch, ele sugeriu que se fizesse uma novela tendo
como cenário principal uma gafieira dos tempos em que ele chegara
da Rússia, e cujo nome era "Kananga do Japão".
Havia o filme "Cabaret", um palco da Berlim dos anos 20 do século
passado. A partir desse palco, foi
contada a história da ascensão do
Terceiro Reich. Contratei pesquisadores para fuçar a história nacional
dos anos 29 a 39, fizemos um bom
levantamento de fatos políticos, sociais, esportivos e artísticos, mas
nenhum deles sabia o que era Kananga do Japão. Muito menos o
próprio Adolpho, que fora freguês
da gafieira.
Convidamos Dercy Gonçalves
para dar um depoimento sobre
aquele período. E dela veio a luz:
Kananga do Japão era o nome de
um perfume vagabundo, muito usado pelas prostitutas que vinham da
Europa e se instalavam no Mangue
ou nas imediações da velha Praça
Onze.
Numa reunião qualquer, quando
alguém dizia que sentia o cheiro daquele perfume, era um código decente para avisar que havia uma
profissional no pedaço. A partir
dessa informação, foi mais fácil desenvolver o roteiro da novela, na
qual a própria Dercy fez uma ponta,
como a grande comediante do teatro de revista que só acabou com o
advento da televisão, na qual ela
também teve papel de destaque.
Fez um gênero difícil para a sua
época. Ela lembrava que, quando
dizia um palavrão, era criticada como desbocada. E reclamava: "Hoje
o palavrão é expressão cultural".
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