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UM ANO DEPOIS
Os argentinos foram às ruas
para relembrar os dramáticos
acontecimentos de 19 e 20 de dezembro de 2001. Naqueles dias, uma
imensa onda nacional de protestos
culminou na morte de mais de 30
pessoas e na renúncia do então presidente Fernando de la Rúa. Um ano se
passou, mas a Argentina ainda está
longe de ter equacionado os principais problemas que contribuíram
para a "débâcle". O país segue sendo
tratado como uma espécie de pária
da globalização.
A ruína do "currency board" não
significou apenas a derrocada da política econômica introduzida dez
anos antes pelo então ministro Domingo Cavallo e, a não ser no breve
período que antecedeu sua implosão, incessantemente aplaudida pela
nata dos financistas globais. Ela evidenciou um mal mais amplo e mais
profundo, relacionado à incapacidade das instituições políticas argentinas de cumprir seu papel básico de
defender os interesses da nação.
Durante uma década os governantes daquele país abriram mão de
manter uma moeda nacional sob o
argumento, em si mesmo frágil, de
que a hiperinflação havia esfacelado
a confiança dos argentinos no peso.
Delegou-se a tarefa de determinar a
quantidade de moeda em circulação
no país aos humores e à arbitrariedade do mercado financeiro internacional. Isso sem embargo da desnacionalização selvagem implementada
sob Carlos Saúl Menem, a qual, para
citar um exemplo, chegou a indexar
tarifas públicas à inflação observada
nos Estados Unidos.
Um ano depois da queda de De la
Rúa, os credores internacionais continuam dando as costas à Argentina.
Até mesmo as instituições multilaterais, cujo papel é justamente o de
prover financiamento de "última instância", tratam o país como um estorvo. O FMI exige condições draconianas para oferecer uma ajuda modestíssima ao governo argentino.
Enquanto isso, dramas sociais inéditos na Argentina, como as mortes
por desnutrição e a galopante criminalidade, se abatem sobre o país que,
há algumas décadas, era o modelo
mais próximo, na América do Sul, de
um Estado de Bem-Estar Social.
Sem crédito, a Argentina vai realizando um dos ajustes econômicos
mais drásticos de que se tem notícia.
Um megassuperávit no comércio externo traz dólares à custa de uma retração, neste ano, da ordem de 10%
do Produto Interno Bruto. E, vale
lembrar, 2002 será o quarto ano recessivo seguido no país platino. Somente neste mês o ministro da Economia, Roberto Lavagna, "decretou", talvez com excesso de otimismo, o fim do ciclo depressivo.
A mobilização popular que acabou
por defenestrar Domingo Cavallo e
Fernando de la Rúa evidenciou os limites de uma política que prolongadamente impõe desemprego e desalento. Mas ainda é muito arriscado
dizer que os eventos de 19 e 20 de dezembro de 2001 liberaram energias
suficientes para renovar as bases em
que tem tradicionalmente se sustentado o poder político no país vizinho.
Talvez o resultado das eleições presidenciais, previstas para o final de
abril do próximo ano, ajude a responder a essa questão.
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