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HISTERIA DOLARIZADA
Designar o comportamento
dos mercados financeiros como irracional não é novidade.
Com relação ao Brasil, há poucos
meses havia um consenso de que o
país jamais repetiria a Argentina.
Agora muitos se angustiam com a
possibilidade de um "default".
Inquietações do mesmo gênero
surgiram em crises anteriores. Erraram sempre os que apostaram no
exagero. O país não ficou incólume
às turbulências. Nem mergulhou em
situações de colapso financeiro.
Resta saber se, como e quando a
deterioração de expectativas será revertida, deixando para trás a histeria.
O pior cenário é o de aprofundamento da crise até o colapso sistêmico. No cenário alternativo, as condições se deterioram rumo à recessão,
mas sem ruptura ou colapso.
Os mercados julgam que o Brasil
marche para um colapso do sistema
de pagamentos. Desenfreada, a busca por dólares conduziria à destruição do real, incapacitando empresas
e governos a saldar compromissos.
No cenário de ajuste recessivo,
também ocorrem forte desvalorização do real e contração importante
do crédito interno e externo.
A recessão reduziria o poder de
compra de empresas e de consumidores. Também comprometeria o
ajuste fiscal e o gasto público, pois
cairia a arrecadação de impostos.
Mas a diferença crucial entre os
dois cenários está na capacidade de
obtenção de dólares pelo governo.
O colapso ocorre apenas quando
há uma escassez incontornável de
moeda forte, como na Argentina.
A fuga de capitais drenou as reservas daquele país. Além disso, o longo período de câmbio fixo comprometeu a capacidade de exportação da
Argentina, superdimensionando sua
dependência de importações.
Finalmente, a dolarização total da
dívida pública e da própria base monetária tornou inviável a obtenção,
na crise, de divisas em volume suficiente para conter o colapso do sistema de pagamentos. Nesse contexto,
a recessão é incapaz de resolver o
drama essencial: não há como conseguir os dólares necessários.
O caso brasileiro está mais próximo a uma situação em que a recessão
pode ser mais eficiente para a obtenção dos dólares que contenham a
desvalorização cambial.
Três anos e meio depois do abandono da âncora cambial, a estrutura
produtiva pode não ser competitiva a
ponto de conquistar mercados mundiais, de resto desaquecidos.
Mas a substituição de importações
avançou. E não se trata do abandono
de um câmbio irrealista. A recessão
também reduz as importações.
Ou seja, o Brasil tem uma estrutura
produtiva capaz de produzir um saldo comercial maior. Combinada aos
recursos oferecidos pelo FMI e às reservas, cria-se colchão amortecedor
que faz a diferença entre trajetórias
de colapso sistêmico e de recessão.
Na prática, o mais provável é um
terceiro cenário, em que não se produz o colapso do sistema de pagamentos nem a recessão é tão brutal
assim. Os mercados funcionam à
base de expectativas. Se o cenário recessivo sem ruptura se torna mais
provável, a manada muda de direção
e pode até voltar à euforia.
No governo FHC, a dependência
aumentou, mas está longe da tragédia argentina. No Brasil, os sistemas
financeiro e de pagamentos são menos internacionalizados e a estrutura
produtiva pode gerar divisas.
A histeria financeira é dolarizada. Mas a economia brasileira não é.
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