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PAIXÃO E TRANSGÊNICOS
A idéia de travar um debate racional e sereno acerca da utilização de organismos geneticamente modificados (OGMs), os populares
transgênicos, tornou-se uma impossibilidade prática. Contendores de
ambos os lados argumentam de forma tão apaixonada que acabam contaminando a própria racionalidade.
Nessa confusão, é o consumidor que
fica sem saber para que lado ir.
Há dois tipos de risco associados
aos OGMs. Poderiam afetar tanto a
saúde humana como o ambiente.
No primeiro tópico, uma das maiores preocupações dos pesquisadores
é com as alergias. Imagine-se um
novo tipo de milho que utilize um gene tirado do amendoim. Pouca gente
é alérgica a milho, mas número não-desprezível o é ao amendoim. Existe
a possibilidade de que a pessoa alérgica ao amendoim consuma o milho
transgênico e sofra então um choque
anafilático. Os cientistas estão atentos para o problema das alergias, e
não surgiram indícios de que elas
ocorram em níveis significativos.
Um outro risco teórico no consumo de OGMs é que ele leve a complicações desconhecidas por conta do
que os cientistas chamam de efeito
pliotrópico. Mais uma vez, no mundo real não há evidências de que isso
ocorra. Os transgênicos estão nas
mesas dos norte-americanos já há
cinco anos sem que tenham sido
constadas anormalidades.
Sobre o ambiente, as razões para o
temor são mais sólidas. Há estudos,
ainda inconclusivos, que demonstram que a introdução de um OGM
pode afetar outras espécies. Aqui, lida-se com uma cadeia longa e desconhecida de interações entre espécies.
A possibilidade de ocorrerem surpresas é considerável. Para agir com
propriedade, seria preciso avaliar
OGMs caso a caso, e sempre no
ecossistema em que serão introduzidos.
Do mesmo modo que os adversários dos transgênicos não foram capazes de demonstrar de modo irrefutável seus malefícios, os defensores
da utilização desses produtos ainda
não demonstraram de modo cabal a
sua vantagem. As perspectivas teóricas são de fato interessantes. Incluem diminuição ou até eliminação
do uso de agrotóxicos e, para os chamados transgênicos de segunda geração, o aprimoramento do valor nutricional dos alimentos, como no caso do Arroz Dourado, enriquecido
com beta-caroteno, um precursor da
vitamina A. No limite, poderiam até
ser criadas "vacinas" ingeríveis.
Na prática, porém, os ganhos de
produtividade foram bem mais modestos. A crer nos fabricantes, não
foram suficientes nem para compensar o custo da rotulagem obrigatória,
que muitos, inclusive esta Folha, defendem. Por menores que sejam os
riscos de consumir OGMs, eles em
teoria existem. Isso basta para que se
garanta a cada consumidor o direito
de decidir se quer ou não comer a
"comida frankenstein", como foram
apelidados os transgênicos.
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