São Paulo, quarta-feira, 23 de julho de 2008

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Desvio de função

Governo planeja usar recursos do FGTS para financiar o BNDES, à custa de setores carentes, como o de saneamento básico

DE ACORDO com o balanço patrimonial, divulgado pela Caixa Econômica Federal, o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) possuía ativos de R$ 198 bilhões em dezembro de 2007. Estavam alocados em operações de crédito R$ 78,7 bilhões; em títulos da dívida pública, R$ 86,3 bilhões.
De um lado, esse elevado volume de recursos disponíveis aplicados à taxa Selic amplia a rentabilidade do fundo. Por outro, revela dificuldades de efetuar os desembolsos em áreas predeterminadas pela legislação: saneamento básico, infra-estrutura urbana e habitação popular.
Diante de graves problemas gerenciais (alta perda na distribuição de água e indigência contábil, por exemplo), elevado endividamento das empresas de saneamento e limites para a contração de empréstimos por Estados e municípios, o FGTS não consegue executar seu orçamento. Os recursos que "sobram" começam a ser disputados.
Uma alternativa delineada para facilitar os desembolsos foi a formatação do FI-FGTS. Até 80% do patrimônio líquido do FGTS poderia ser deslocado para um fundo de investimento em infra-estrutura. Agora o governo planeja utilizar até R$ 10 bilhões desses recursos destinados ao FI-FGTS para reforçar o orçamento do BNDES.
O banco enfrenta uma demanda por empréstimos muito acima de sua capacidade operacional. Independentemente da engenharia financeira da operação, ainda em estudo, o repasse ao banco de fomento não configura a melhor solução para o problema dos recursos disponíveis no FGTS. Desviar recursos do fundo significaria prejudicar setores carentes e prioritários, que dificilmente encontrarão outra fonte de financiamento.
O mais correto seria enfrentar as questões que inviabilizam a expansão dos empréstimos com recursos do FGTS. Isso exige a reestruturação patrimonial das companhias de água, esgoto e habitação popular, bem como melhorias gerenciais de monta; exige, também, a revisão, mediante compromissos firmes de modernização da governança corporativa, dos limites de endividamento dessas empresas, a fim de que retomem os investimentos.
Como os recursos do FGTS são federais, e as empresas executoras, estaduais ou municipais, o equacionamento desse imbróglio deve passar por uma negociação do Ministério das Cidades com governadores e prefeitos.
Diante dos baixos rendimentos de boa parte da população, o que restringe a capacidade de pagamento dos mutuários, haveria ainda a necessidade de repensar os mecanismos de subsídios para a construção de habitação popular. Uma possibilidade seria integrar o uso dos recursos previstos (e não gastos) no Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social com os desembolsos do FGTS destinados a populações de baixa renda.


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