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ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES
A água e os
futuros conflitos
Consta que, ao saber da renúncia de Jânio Quadros, em agosto
de 1961, o primeiro-ministro de Israel,
David Ben-Gurion, com espanto, afirmou: "Não entendo essa renúncia, logo em um país que tem tanta água...".
Até hoje a água é questão de vida ou
morte para Israel e para várias nações
das bacias dos rios Nilo, Jordão, Tigre-Eufrates e Indus. Essa escassez envolve vários países no norte da África,
Oriente Médio e sul da Ásia. Nos últimos 35 anos, o lençol freático do norte
da China, em especial Beijing, desceu
59 metros! Em importantes regiões da
Índia, o lençol freático está descendo
1,5 metro por ano!
São nações que padecem da falta de
água e que estão fadadas a entrar em
conflito por causa do precioso líquido
(Michael T. Klare, "Resources Wars",
Henry Holt and Company, Nova
York, 2002). Não será o primeiro e
nem o último atrito dessa natureza. A
história da Mesopotâmia e o livro do
Êxodo do Velho Testamento narram
inúmeras batalhas travadas entre tribos que disputaram com suor e sangue as águas dos rios Jordão, Tigre e
Eufrates.
Para se manterem vivos e saudáveis,
cada ser humano precisa de quase 200
litros de água por dia -72 metros cúbicos anuais. Além disso, eles dependem da agricultura, indústria e produção de energia, que elevam sua necessidade para mil metros cúbicos por
ano.Vai dar para atender a essa demanda no futuro?
Considerando que as populações
das nações mais carentes crescem acima de 3% ao ano (quando a média do
mundo é de 0,8%) e que a distribuição
geográfica da água é extremamente
desigual, a resposta é não.
As nações que dependem do rio Nilo
(onde já há escassez) estão nesse caso.
A Etiópia, que tinha 62 milhões de habitantes em 1998, terá 212 milhões em
2050; o Sudão saltará de 29 milhões
para 60 milhões; o Quênia, de 29 para
66 milhões; Uganda, de 21 para 66 milhões -o que dará um acréscimo de
300 milhões de pessoas só naquela região. A população das nações do
Oriente Médio e do sul da Ásia, que
dependem dos rios Jordão (Israel, Jordânia e Líbano), Tigre e Eufrates (Iraque, Síria e Turquia) e Indus (Índia e
Paquistão), saltará de 1,1 bilhão para
quase 2 bilhões.
Não há a menor possibilidade de
atender a essa demanda, mesmo porque é aproximadamente 1% o volume
de águas do planeta que pode ser utilizável. Os conflitos serão inevitáveis.
O Brasil é privilegiado. Só a bacia
Amazônica tem 16% da água do mundo. Nossas chuvas são generosas.
Além disso, temos vários aquíferos
(água subterrânea) ainda intocáveis.
Mas nada disso é motivo para continuarmos esbanjando a água e outros
recursos naturais. Se pintarmos o mapa do mundo, uma parte será negra,
simbolizando o petróleo e o carvão;
outra será azul, simbolizando a água;
outra branca, para as pedras preciosas; verde para as florestas; e o vermelho, o cobre, o ferro e outros minerais
importantes. Pintado dessa maneira,
ressaltarão as áreas com maior profusão e maior brilho das cores. A maioria estará no Brasil.
É uma dádiva de Deus que teremos
de cultivar e preservar.
Antônio Ermírio de Moraes escreve aos domingos nesta coluna.
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