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ACESSO À UNIVERSIDADE
O governo federal encaminhou ao Congresso projeto de
lei que estabelece novos critérios de
acesso ao ensino universitário. São
duas propostas básicas. A primeira
delas determina que as instituições
de ensino superior privadas que usufruem de incentivos fiscais, como as
entidades filantrópicas, devem destinar 20% de suas vagas para bolsas de
estudo integrais, sem o que perderiam os benefícios a que têm direito.
Com essa medida, o Ministério da
Educação (MEC) espera aumentar
consideravelmente a oferta de vagas
para alunos de baixa renda no ensino
superior. O programa também garantiria a contrapartida que, não raro, essas instituições deixam de conceder, recorrendo a subterfúgios como diluir a obrigatoriedade de concessão de bolsas em pequenos "descontos" nas mensalidades.
A segunda proposta do MEC é reservar 50% das vagas de graduação
das universidades federais para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio público. A
idéia é, mais uma vez, favorecer alunos de menor renda, impossibilitados de freqüentar o ensino privado.
A proposta referente à "estatização" de vagas de faculdades e universidades filantrópicas é engenhosa,
mas nem por isso deixa de suscitar
ponderações. O governo não precisaria necessariamente abdicar dos
recursos gastos com a renúncia fiscal. Eles poderiam, em tese, ser recolhidos e destinados ao ensino público. É evidente também que muitos
dos estabelecimentos privados,
diante da inação governamental, tornaram-se notórios por seu pífio desempenho acadêmico, pela ausência
de investimento na produção de conhecimento científico e pela habilidade em burlar os métodos de controle de qualidade.
Mais questionável ainda é pretender corrigir no topo um desvio que
começa na base. O problema da democratização do ensino se inicia no
ensino fundamental deficiente oferecido pelo Estado, que leva famílias de
classe média a procurar escolas privadas e condena os filhos das mais
pobres a uma formação deficiente
que os prejudica na disputa por vagas em universidades públicas.
A reserva de vagas para estudantes
de escolas públicas não resolve a
questão, como também não assegura que os beneficiados sejam os mais
pobres -uma vez que não há na
proposta um corte por renda. Não é
improvável que estudantes menos
qualificados de classes mais abastadas migrem para o ensino público visando beneficiar-se da cota. É preciso lembrar que hoje a presença de estudantes egressos do ensino público
nas universidades federais já é, em
média, de 42%. Os ganhos, portanto, seriam marginais.
Certamente as propostas não agravam a situação -ao contrário, tendem a melhorá-la. Deveriam, contudo, ser vistas pelo ministério apenas
como parte de um contexto maior,
que está a exigir medidas mais profundas e abrangentes.
Não se pode esquecer de que o papel das universidades não se reduz a
formar profissionais para o mercado
de trabalho. Essas instituições devem estar voltadas essencialmente à
produção científica e à formação de
pesquisadores altamente qualificados. Não são, como sugere o nome
do programa do governo, "para todos", mas para uma elite intelectual
que tem condições de atender às exigências da vida acadêmica. Para que
essa elite possa contar com maior
presença de representantes das classes de baixa renda, seria preciso dar
conta de questões estruturais, algo
que não se faz num passe de mágica.
Por outro lado, no ensino superior
deve haver instituições que atendam
à demanda por formação de bons
profissionais para o mercado de trabalho. Assim, seria necessário colocar o debate sobre o desenho de um
novo sistema que contemplasse, como ocorre em vários países, opções
qualificadas de ensino superior profissionalizante e universidades verdadeiramente de excelência.
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