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O déficit e o desafio
Para evitar que o país pague um preço alto pela turbulência externa, governos deveriam congelar seus gastos
O DÉFICIT nas transações
financeiras entre o
Brasil e o restante do
mundo cresce por razões que estão longe de ser catastróficas. O principal motivo é o
fato, raro nas últimas décadas, de
a atividade econômica no Brasil
estar se expandido acima do ritmo internacional.
O PIB em alta alavanca importações e incentiva muitas empresas brasileiras a trocar a clientela
estrangeira por consumidores
domésticos, o que resulta no estreitamento rápido do saldo comercial. No primeiro semestre, a
diferença entre exportações e
importações foi de US$ 11,3 bilhões, contra US$ 20,6 bilhões na
primeira metade de 2007.
O bom momento da economia
local também leva as empresas a
obter volumes recordes de lucros. Em conjunto, 257 companhias abertas listadas na Bovespa lucraram mais de R$ 120 bilhões no ano passado, 20% acima, descontada a inflação, do resultado, já muito bom, de 2006.
Com as multinacionais instaladas aqui não foi diferente. Uma
boa fatia de seus lucros recordes,
no entanto, teve de ser transferida para sanar problemas de caixa
de suas matrizes em nações desenvolvidas, que passam por
uma estagnação econômica. Por
conta disso, a remessa de lucros e
dividendos no primeiro semestre disparou, atingindo US$ 19
bilhões. De janeiro a junho de
2007, esse fluxo não passou de
US$ 10 bilhões.
A continuidade dessa última
tendência depende, é claro, da
conjuntura econômica no mundo rico. As transnacionais vão
ponderar entre a opção de investir mais lucros no Brasil -para
atender à demanda doméstica
crescente e, assim, manter as
condições de lucratividade- e a
de continuar com o foco no equilíbrio financeiro das operações
em seus países-sede.
Já em relação ao saldo comercial decrescente, o Brasil tem alguma condição de intervir para
que a tendência não venha a alimentar, no futuro, uma nova crise cambial. O desafio é derramar
um pouco de areia na engrenagem do consumo doméstico -fator que impulsiona as importações- com o mínimo de repercussão negativa sobre o apetite
das empresas por novos investimentos produtivos.
O aperto monetário iniciado
em abril pelo Banco Central já
mostra resultados. Os juros do
crediário deram um salto e a
concessão de empréstimo para
pessoas físicas começa a se desacelerar. Mas um dos efeitos colaterais da medida -que aumenta
o apetite de aplicadores estrangeiros por papéis da dívida pública brasileira e derivados- também se evidencia. Apesar de as
contas financeiras externas do
país mergulharem mais fundo
no vermelho, o real continua a
valorizar-se diante do dólar.
O Brasil dará um salto de qualidade na política econômica se
adotar, para os próximos dois ou
três anos, um programa para
congelar nos patamares atuais os
gastos de manutenção da máquina pública em todos os níveis de
governo. Essa é a melhor maneira de enfrentar uma turbulência
global que promete ser longa -e
talvez ainda mais penosa do que
se mostrou até agora.
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