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Apesar das recomendações, programas da madrugada têm público
fiel de crianças e adolescentes; educadores divergem sobre o fenômeno
Altas horas
Flavio Florido/Folha Imagem
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Priscila Castello Branco, 14, assiste à TV de madrugada em casa; ela diz que fica cansada na primeira aula do dia seguinte |
RODRIGO RAINHO
DA REPORTAGEM LOCAL
APESAR de o Ministério da Justiça
desaconselhar a programação da
TV a menores de 18 anos após as 23h,
milhares de crianças e adolescentes compõem a audiência da madrugada.
Entre os dias 1º e 20 de fevereiro deste
ano, por exemplo, dados do Ibope mostram que o erótico "Noite Afora" (Rede
TV!, 1h) foi assistido por 6.490 crianças
entre 4 e 11 anos só na Grande São Paulo.
E o "Eu Vi na TV" (seg.,23h30), da mesma emissora, teve quase 50 mil telespectadores na faixa etária citada.
"Assisto ao programa da Monique
[Evans" quase todos os dias. Gosto das
reportagens do drag queen Leo Áquila",
diz Raul Silva Santucci, 12, aluno da 5ª série, sobre o "Noite Afora".
"Não proíbo nada, mas aí vem a tendência dele de assistir a programas ruins,
com temas inadequados", diz Rosemary
Santucci, mãe de Raul. "A abordagem do
sexo nessas atrações é mais uma sátira."
Lucas Polite, 12, da 6ª série, diz que
dorme pouco. "Atrapalha a concentração na aula", afirma. Mas não dispensa
as pegadinhas do "Eu Vi na TV".
"É bom ver pessoas comuns ficarem
bravas. Sinto vontade de ver o ator apanhar", afirma ele, que tem pena dos idosos vitimados pelas armações.
Contramão
Guilherme Lion, 11, da
5ª série, tem TV no quarto desde os cinco
anos, mas está no time dos que optam
pela programação infantil.
"Um amigo convidou quase toda a
classe para assistir a um programa erótico no canal Multishow. Decidi não ver,
sou uma criança, prefiro os desenhos do
Cartoon", diz ele. "Também não quero
sair das regras, minha mãe não dá permissão para isso", afirma.
A mãe de Guilherme, Maria Eliza Lion,
veta alguns programas, como novelas e
filmes adultos. "A violência me preocupa
mais que a erotização", diz.
Gustavo Raguzzani, 14, aluno da 8ª série, afirma que se não tiver mulher nua
no "Noite Afora" muda de canal.
Segundo seu pai, Elias Raguzzani, não
há patrulhamento. "Aqui, cada um tem a
sua TV e vê o que quer. Meus filhos sabem o que é melhor para eles. Esses programas da madrugada são ridículos."
Priscila Castello Branco, 14, também da
8ª série, sente cansaço na primeira aula
quando assiste à TV até tarde. Ela vê o "A
Noite É Uma Criança" (Band, 0h30).
"Quando não tem nada bom na TV,
vejo o [Otávio] Mesquita, apesar de
achá-lo bobo. A Monique fala muita bobagem e é vulgar", diz.
Ariadne Castello Branco, mãe da adolescente, afirma que tenta convencê-la a
não assistir a "programas ruins". "Prefiro conversar, dá mais resultado."
Sadomasoquismo é o tema predileto
de Rodolfo Alexandre Lopes, 15, na madrugada. "Sexo em geral me atrai, mas a
maioria dos programas não mostra."
Prós e contras
Para a psicopedagoga Maria Rosa Sancho Moreira, atrações da madrugada afetam as crianças.
"Elas têm o tempo de sono reduzido, ficam hiperexcitadas e ansiosas", diz. "Esses programas prejudicam a formação
da personalidade. Os pais devem selecionar a programação e limitar o tempo
diante da TV."
A mesma opinião tem Neide Saisi, professora da Faculdade de Educação da
PUC-SP. "Embora o adolescente já tenha
o corpo desenvolvido, ele não adquiriu
maturidade psicológica para lidar com o
sexo. Para a criança é muito pior, ela não
entende a erotização."
Para Claudemir Edson Viana, pesquisador do Lapic (Laboratório de Pesquisa
sobre Infância, Imaginário e Comunicação), da ECA-USP, não há problema.
Priscila Castello Branco, 14,
assiste à TV de madrugada em casa; ela diz que fica cansada na primeira aula
do dia seguinte
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