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São Paulo, domingo, 10 de agosto de 2003

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AGENDA PETISTA

Governo quer inaugurar "segunda fase" com reforma ministerial

Pós-reformas, Lula pretende trocar "amigos" por eficiência

Sergio Lima/Folha Imagem
FUTEBOL E CONTUSÃO Com a camisa do Corinthians, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva chega à Granja do Torto para participar de churrasco e de uma partida de futebol; no destaque, o presidente, que foi substituído no jogo após se contundir, coloca gelo no joelho

VALDO CRUZ
DIRETOR-EXECUTIVO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

ELIANE CANTANHÊDE
DIRETORA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O cenário pós-reforma traçado por ministros e assessores do presidente indica que Luiz Inácio Lula da Silva terá de dar uma chacoalhada em seu governo, ser mais agressivo nas políticas públicas e optar: ou fazer uma melhor administração ou manter nos cargos amigos e velhos aliados que não estão funcionando.
Essa opção teria de ficar clara na reforma ministerial, planejada para marcar uma "segunda fase" do governo imediatamente após a aprovação das reformas da Previdência e tributária no Congresso Nacional. Antes disso, falar em troca de ministros pode provocar pressões e uma corrida por cargos, mais dificultando do que ajudando nas votações.
Essa mexida é considerada fundamental dentro do próprio governo, segundo a Folha apurou, para montar uma equipe que seja capaz de produzir melhores resultados em 2004.
Com isso, o governo quer tirar a impressão generalizada, em seus próprios centros de decisão e na oposição, de que os ministérios estão ""devagar". De quebra, consolidar um programa de governo em 2005, preparando o terreno para a reeleição em 2006.
Antes de pular para essa fase, o governo começou na semana passada a sair da defensiva dos últimos meses, quando viu crescer o desemprego e a crise social. Na busca de produzir uma agenda positiva, anunciou duas medidas para reanimar a economia: a redução de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) para automóveis e a queda do compulsório para os bancos.
Só que essas são medidas que podem acabar tendo impacto limitado. O Planalto planeja também uma série de anúncios e ações a partir desta semana, no rastro da aprovação da reforma da Previdência -considerada "um marco" nos círculos palacianos. Os alvos são, principalmente, habitação e saneamento, para dar uma resposta às invasões de sem-teto; reforma agrária, para tentar acalmar o MST e correlatos; e infra-estrutura, para suportar um ritmo maior de crescimento ao longo do governo.
Lula reúne amanhã, no Planalto, ministros e representantes do BNDES, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e Petrobras para acertar um pacote em infra-estrutura -transportes, energia e comunicações.
Na semana passada, o ministro dos Transportes, Anderson Adauto, já se reuniu com o do Planejamento, Guido Mantega, para acertar o aporte de recursos para estradas, ferrovias e hidrovias, neste e no próximo ano.
"São projetos estruturantes e as propostas, apesar de realistas, são expressivas", disse Mantega à Folha, sem falar em valores, mas concordando com informação obtida no Palácio do Planalto de que um dos destinos do excedente do superávit primário será para essa área. O acerto com o FMI (Fundo Monetário Internacional) era de um superávit de 4,25% do PIB, mas o governo opera com mais de 5%. A folga deverá ser usada neste segundo semestre.
Um pacote na área de habitação e saneamento é considerado estratégico, porque o governo quer manter alguma marca de ""esquerda", amenizar a tensão urbana e gerar empregos.
A questão é reunir recursos. O ministro Olívio Dutra (Cidades) entregou seu planos na quarta-feira passada para José Dirceu (Casa Civil) e aguarda o aval de Lula nesta semana.
Em resumo, são o Pró-Moradia e o Morar Melhor. Um depende de uma excepcionalidade, para quebrar o limite de R$ 200 milhões em financiamentos determinado pelo CMN (Conselho Monetário Nacional) para o conjunto do setor público. O segundo precisa de liberação de verbas bloqueadas do Orçamento.

Reforma agrária
A terceira frente, a ser anunciada ainda nesta semana, é a reforma agrária -que Lula trata como prioridade. O governo identificou 700 mil hectares disponíveis de terras públicas da União, o que é metade do necessário para assentamento de 60 mil famílias a partir deste ano. Os terrenos deverão ser menores, "mas melhores e mais bem localizados", diz Mantega.
Enquanto ganha tempo e anuncia medidas pontuais e limitadas, o governo espera ter condições de se planejar para sua segunda fase, após a aprovação das reformas. O fraco desempenho de alguns ministros é um dos problemas a serem enfrentados.
Até aqui, avaliam assessores do presidente, a ineficiência de algumas áreas do governo não chegou a comprometer por causa da crise econômica: o país não crescerá mais do que 1,5% do PIB (Produto Interno Bruto) neste ano e, no próximo, a expectativa, vista com reservas pelo mercado, é de um crescimento de 3%.
Na avaliação da equipe econômica, um crescimento desse porte não provoca transtornos na economia. O país tem infra-estrutura razoável para aguentar sem sustos esse ritmo. Ou seja, a ausência de grandes ações do governo não chega a ser um empecilho para o país crescer 3% ao ano.
Em 2005, porém, a expectativa do governo é chegar a uma taxa de crescimento de 4% do PIB. Hoje, na avaliação da equipe econômica, o país não suportaria crescer a uma taxa superior a 4% sem produzir inflação e descontrole das contas públicas.
Então, é preciso preparar o país para voltar a crescer a taxas mais elevadas. Se isso não for feito, em 2006 o país pode enfrentar uma nova crise econômica e não terá condições de manter pelo menos um ritmo de desenvolvimento de 4%. Seria péssimo na avaliação do governo, afinal é o ano da eleição presidencial, com Lula provavelmente disputando a reeleição.
Logicamente, isso tudo é condicionado à manutenção de um certo equilíbrio macroeconômico e aos humores do mercado internacional -uma crise mais grave pode acabar com quaisquer planos.
Um auxiliar do presidente diz que o governo Lula não pode repetir os erros da administração tucana, quando ocorreram surtos de aquecimento da economia, não de crescimento. O ano de 2000 é citado como exemplo, quando o país cresceu 4,5%. No seguinte, veio a crise energética e o país ficou estagnado.
Lula, até agora, tem demonstrado insatisfação especialmente com o grupo de ministros que é historicamente mais próximo a ele, mas sem sinalizar que pretende abrir mão deles.
Segundo assessores, o melhor caminho seria a "tradicional queda para cima": sacar da Esplanada ministros como José Graziano (Fome Zero), Benedita da Silva (Promoção Social) e Miro Teixeira (Comunicações), alojando-os em outros postos federais. Ou estimular candidaturas às prefeituras no ano que vem.
Segundo um auxiliar de Lula, para muitos ministros petistas ou aliados "ainda não caiu a ficha de que, agora, são governo". Fazem reuniões em demasia, demoram a tomar decisões e, quando o fazem, nem sempre são factíveis nem estão conectadas com uma linha de governo. O discurso ainda é o de palanque, de teses, de princípios. O chamado núcleo duro do governo quer mais ação.



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