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"Só tenho inveja de quem sabe ler"
DA REPORTAGEM LOCAL
Maria das Graças da Silva Rios,
39, é empregada doméstica e uma
de suas atribuições é tomar conta
de um menino de quatro anos. À
noite, é ele quem pega um livro e
lê histórias para ela.
Piauiense de Campo Maior, foi
pequena para o interior do Maranhão, onde trabalhava na roça.
"Todo mundo era igual e ninguém sabia assinar o nome", diz.
Lembra que ia à escola, assistia a
um mês ou dois de aula, mas aí
precisava voltar ao trabalho.
Há cerca de quatro anos, aprendeu a escrever uma única palavra,
seu primeiro nome. Quando recebe entregas do correio na casa em
que trabalha, assina "Maria" e
mais nada. "Graças, Silva e Rios
eu não consigo", afirma.
Ela diz que deixa de fazer muita
coisa porque tem vergonha de
usar a impressão digital. Afirma
que, no banco, sofreu para abrir a
caderneta de poupança. Para depositar e sacar dinheiro, pede ajuda a funcionários. "Tem dia em
que penso: será que fui enganada?
Mas nem posso reclamar."
E logo adverte: "Não pense que
sou trouxa, sou esperta". Explica
que decorou o número dos ônibus para andar pela cidade. "Não
sou rica, mas não tenho inveja de
ninguém. Só de quem sabe ler."
Depender dos outros é o que
mais incomoda a dona-de-casa
Elza Maria Dantas da Costa, 30.
Ela saiu do Rio Grande do Norte
rumo a São Paulo há dez anos. Casou-se com o pedreiro José Antônio, 38. Conta que, quando vai visitar alguém e tem de procurar
um endereço, vai acompanhada
do marido: ela nunca aprendeu a
ler. "Ele também não sabe, mas
conhece melhor São Paulo", diz.
Mesmo sem ler as placas, eles
dizem que acham seus caminhos.
Os filhos estão na escola. Ela tem
um sonho. "Quando eu aprender,
vou ser mais feliz. Não vou pedir
nada a ninguém e vou ter um diário."
(BRUNO LIMA E SÍLVIA CORRÊA)
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