São Paulo, domingo, 06 de outubro de 2002

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CARLOS HEITOR CONY

Tenho dito

RIO DE JANEIRO - O lugar-comum carimbou o ato de votar como dever cívico. Sendo dever, tornou-se obrigatório. Penso diferentemente: votar é um direito cívico, mas não deve ser obrigatório, pois nem sempre reivindicamos aquilo a que temos direito. Exemplo: tenho o direito de fundar uma religião, de ir para a Cinelândia e de anunciar o fim dos tempos. Fiquem tranquilos, pois não usarei deste direito.
Sendo obrigatório, o voto arrebanha milhões de eleitores que não sabem, não gostam, não se incomodam e, sobretudo, não estão preparados para votar. Sobretudo numa eleição complexa, em que cada cidadão terá de escolher seis cidadãos que mal conhece, ou conhece por ouvir dizer, e fazer deles seus representantes -representantes que nem sabem exatamente quem e o que representam.
Sendo facultativo, o voto seria mais consciente, ninguém sairia de casa para cumprir (às vezes de má vontade) uma obrigação da qual tem vaga noção, mal sabendo distinguir um deputado estadual de um federal, e, em alguns casos, um governador de um presidente da República.
Muito comum nas filas eleitorais a perplexidade do cidadão que ali chega e não sabe em quem votar e como votar, sobretudo agora, com a informatização do processo.
O voto facultativo seria, por definição, mais consciente. O obrigatório, em muitíssimos casos, é um trambolho do qual o cidadão deseja logo se livrar. A ida ao correio para justificar a ausência em sua zona eleitoral é outro trambolho que poderia ser evitado, se o voto fosse realmente livre.
Bem, apesar dessas considerações, recolho-me em piedosa concentração doméstica, pedindo aos deuses, aos manes protetores da nação, que iluminem com suas luzes e graças os votantes e que das urnas de hoje saia um Brasil melhor, mais justo e mais saudável.
Como os oradores de sobremesa, encerro a crônica com o afirmativo "tenho dito!".


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