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CARLOS HEITOR CONY
Os quebrados e a quebradeira
RIO DE JANEIRO - Não deveria me espantar, mesmo assim, sempre me
espanto quando tomo conhecimento
dos cálculos feitos pelos economistas
do governo -de qualquer governo. É
assombroso como eles conseguem
chegar a tetos e a pisos sem excluir sequer os quebrados que, na vida comum de todos nós, geralmente são
arredondados para cima ou para
baixo conforme a circunstância e o
troco.
Por exemplo: falaram por aí num
teto ou num piso de R$ 1.058. Implico
com esses oito reais, que diabo, porque não arredondaram para cima, já
que o 58 está mais perto de 60 do que
de 50? E como chegaram a tal precisão, que motivará milhões de reais a
mais ou menos em circulação?
Uma velha história atribuída a Rubem Braga merece ser contada. Chegando a uma cidade do interior, ele
quis conhecer o mulherio local e foi
ao bordel que lhe indicaram como o
melhor. Prevenido como sempre, escolheu uma profissional, mas quis saber o câmbio em vigor, medida cautelar que qualquer viajante adota
quando navega em águas desconhecidas. A moça informou: "38 cruzeiros e 50 centavos".
Rubem se espantou: "Minha filha,
isso é conta de telefone, não é michê
que se preze!".
Não vem ao caso que a moeda naquela época ainda não era o real. A
fração é mais ou menos a mesma, e
equivale a diversos cálculos que foram feitos pelo governo e pela oposição para equilibrar as contas da Previdência e contentar ou descontentar
os interessados.
Não estou comparando salários dos
servidores a michês das profissionais,
que também prestam serviço e, de
uma forma ou de outra, serão beneficiadas ou prejudicadas pelas medidas em discussão. Creio que não foram ouvidas.
Para falar a verdade, muita gente
também não foi ouvida. A impressão
é que todos falaram muito e ninguém
ouviu. Na base de cálculos que parecem chutados, não se sabe se com
tantos quebrados a quebradeira da
Previdência ficará maior ou menor.
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