A escola
pública brasileira, que deveria ser um lugar de inclusão
e convivência de diversidades, tem se transformado em
um ambiente onde o aluno se sente vulnerável e inseguro.
Essa é a conclusão apontada no relatório
preliminar da pesquisa "Vitimização nas
escolas", que será apresentado hoje em Brasília
pela Unesco (Organização das Nações
Unidas para a Educação, Ciência e Cultura).
Entre os alunos entrevistados na rede pública de cinco
capitais e do Distrito Federal, 83,4% disseram existir violência
em sua escola. O roubo é o tipo mais freqüente,
citado por 69,4% dos estudantes. Dos que já foram roubados
na escola, 37,1% responderam ter sido vítima uma ou
mais vezes no último ano. Um dado preocupante: 4,8%
dos entrevistados assumem já ter participado de algum
roubo na escola.
"O roubo se tornou algo secundário, normal. Foi
completamente banalizado. Muitas vezes os alunos reclamam,
mas não têm resposta de diretores ou professores.
Isso faz com que se sintam vulneráveis", afirma
a socióloga Miriam Abramovay, coordenadora da pesquisa.
Insegurança
Segundo a pesquisadora, há o relato sobre
o caso de um professor que fez com que todos os alunos abrissem
as mochilas após uma estudante ter denunciado um furto,
o que fez os colegas de classe ficarem irritados com ela.
"Isso faz crescer o sentimento de insegurança",
diz Abramovay.
Além da banalização, a pesquisa aponta
que o roubo pode ser um ato de exibicionismo ou de tentar
obter aquilo que o aluno não tem. "Roubaram muita
coisa na minha sala. Este ano, já perdi dois estojos
cheios de lapiseira, caneta, lápis de cor. Mas tem
que tomar cuidado. Dessas coisas pequenas, daqui a pouco estão
roubando dinheiro", diz o depoimento de um aluno do ensino
fundamental no Distrito Federal.
Abramovay apresentará hoje esses dados preliminares
na abertura do Congresso Ibero-americano sobre Violências
nas Escolas, em Brasília. O objetivo do encontro é
incentivar a pesquisa e o intercâmbio de experiências,
além de propor recomendações de políticas
públicas para enfrentar a violência escolar.
No trabalho da Unesco foram aplicados questionários
a 12.312 alunos e 2.395 adultos (professores, diretores e
funcionários) em 143 escolas da rede pública
das cidades de Belém, Porto Alegre, Rio de Janeiro,
Salvador, São Paulo e Distrito Federal.
A amostra foi expandida, por isso os dados correspondem, segundo
a Unesco, a 2,115 milhões de estudantes do ensino fundamental
e médio.
Agressão
Segundo o levantamento, 4,7% dos alunos já
apanharam na escola durante o último ano.
Ao tratar de entrada de armas em escolas, a pesquisa mostra
que a mais comum é o canivete: 21,7% disseram já
ter visto um. Outros 12,1% disseram ter visto revólver
na escola e 13%, faca.
"A minha colega entrou com uma faca de mesa. Porque
a moleca de outra gangue queria agarrar ela, queria furar
ela e ela trouxe uma faca", diz o relato de uma aluna
do ensino fundamental de Belém.
Para Abramovay, a escola precisa se tornar um local de diálogo
com o objetivo de tentar reverter o quadro de violência
que tem sido registrado.
"Na escola tem funcionado a lei do silêncio, em
que os alunos fingem que nada está acontecendo, os
diretores ignoram e os professores também não
falam, muitas vezes até por medo de represália.
Com isso, a escola se torna um lugar desprotegido, que não
consegue passar valores mínimos", diz a pesquisadora.
Apesar dessa visão crítica, 49,2% dos alunos
consideram sua escola boa ou ótima. Outros 43,1% disseram
que seu colégio é "mais ou menos".
LUCIANA CONSTANTINO
da Folha de S.Paulo
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