|
Em
75% de 56 casos registrados no ano passado em que houve testemunhas,
a vítima foi morta depois de resistir ao agressor
Folha teve acesso a 80 das 123
ocorrências registradas em 2008 na capital e Grande
São Paulo; crime cresceu 50% em relação
a 2007
Um levantamento feito pelo jornal Folha de S. Paulo constatou
que o número de latrocínios aumentou na cidade
de São Paulo. Foram pesquisados 80 boletins de latrocínio
(roubo com morte) em 2008, de um total de 123. Dos 56 casos
em que os policiais conseguiram testemunhas para descrever
o desfecho trágico, em 42 deles (75%) a vítima
reagiu de forma violenta. O latrocínio foi um dos crimes
que mais cresceram no ano passado, segundo as estatísticas
divulgadas pela Secretaria da Segurança. Passou de
82, em 2007, para 123 casos - crescimento de 50%.
O empresário Joenilson Xavier Mendes, 46, proprietário
do restaurante Konstanz, em Moema (zona oeste de SP), tentou
agredir a cadeiradas um dos ladrões que entraram no
seu estabelecimento para roubá-lo. Acabou morto com
três tiros. Assim como o empresário, morto em
maio de 2008, a maioria das mortes durante os roubos em São
Paulo e na Grande SP ocorreu porque as vítimas tentaram
resistir.
A reportagem não computa nessa lista de resistência
outros quatro casos em que a ação da vítima
não foi violenta. Foi o caso, por exemplo, da ginecologista
Nadir Oyakawa, 53, que morreu baleada porque, cercada por
bandidos armados, resolveu buzinar seu veículo para
chamar a atenção de parentes. Nos 24 boletins
sem informações precisas, a polícia também
acredita ter havido alguma reação -violenta
ou não. As reações não-violentas,
como no caso de Nadir, podem ser desde um movimento brusco,
uma frase mal colocada ou uma tentativa de fugir com o objeto
pretendido pelo ladrão. Um exemplo disso foi o assassinato
do aposentado Luiz Carlos Amigo, 54, de São Caetano
do Sul (Grande SP), em 5 de dezembro. Ele foi morto porque
achou que o assalto fosse uma brincadeira. De acordo com a
irmã da vítima, Carmen Estevam Amigo, 67, quando
o ladrão anunciou o assalto, o aposentado disse: "É
brincadeira". O assaltante, então, encostou a
arma nas costas dele e puxou o gatilho. "É brincadeira.
Tome, vacilão", teria dito o bandido, conforme
repetiu Carmen, que estava ao lado do irmão, aos policiais.
Para o delegado Marcos Carneiro, 51, do DHPP (Departamento
de Homicídios e Proteção à Pessoa),
os ladrões envolvidos nos latrocínios geralmente
não queriam matar ninguém e só atiram
devido ao comportamento da vítima. "Quer dizer,
então, que a vítima é culpada por ter
morrido? Não. O culpado é o criminoso, mas a
reação da vítima é que dispara
a ação do criminoso." Isso ajuda a explicar
porque em quase metade dos latrocínios (46,1%) os bandidos
acabaram fugindo sem levar nada da vítima já
ferida.
Perfil
O levantamento feito pela Folha também mostra que a
maioria dos mortos, um quarto de todas as 84 vítimas,
era de comerciantes (21). Em pelo menos 11 desses casos, a
polícia sabe que houve resistência. Dos 37 latrocínios
da capital analisados pela Folha, 15 deles ocorreram na zona
leste -sendo 11 nas áreas mais pobres. Já na
zona sul, dos 13 latrocínios registrados, cinco também
foram em bairros mais carentes. Na zona oeste foram cinco
casos, na norte, dois e na região central, outros dois.
Além dos comerciantes, os latrocínios também
tiveram como alvo muitas pessoas ligadas à área
de segurança, policiais ou vigias, com 20% das vítimas
(17). Em seguida vêm os autônomos e profissionais
liberais com 19% do total (16). Das pessoas assassinadas,
44% tinham ensino médio, 40% o ensino básico
e apenas 14,3% haviam concluído o ensino superior,
como Nadir.
Rogério Pagnan
André Caramante
Folha de S. Paulo
Áudio
dos comentários
| |
|