Em
vez de concentrar esforços para chamar para si os jovens,
o jornal parece preferir esperar que eles sozinhos substituam
seus pais como leitores
Ajudar a criar e manter nas crianças
e adolescentes o hábito da leitura no papel deveria
estar entre as prioridades máximas da estratégia
de todo veículo de comunicação impressa.
Os sinais de que os jovens sentem enorme atração
pelos signos digitais são ostensivos e indiscutíveis.
Os riscos de empobrecimento intelectual com o fim da leitura
tradicional também são bastante conhecidos.
O neurocientista Ken Pugh, da Universidade Yale, especialista
em cognição infantil, diz que a leitura no papel
é "sem dúvida mais enriquecedora cognitivamente"
do que as informações rápidas e intermitentes
obtidas na tela do computador pela internet.
O esforço da Folha para conquistar leitores das faixas
etárias iniciais se concentra em dois suplementos semanais:
a Folhinha, que circula desde 1963 aos sábados, e o
Folhateen, que sai às segundas desde 1991.
Há pelo menos duas abordagens editoriais possíveis
para esse tipo de produto. Uma é defendida pela leitora
Doralice Araújo, professora em Curitiba, grande entusiasta
de causas educacionais e mantenedora de um dinâmico
blog (http://portal.rpc.com.br/gazetadopovo/blog/namira).
Eles "devem ser material de apoio, de consulta e de assertividade"
para a função de alunos de seus leitores, defende.
Mônica Pinto Rodrigues da Costa, ex-editora da Folhinha,
em tese de mestrado indicada abaixo, ressalta a importância
do lúdico e do estético nos cadernos para jovens.
Vai na direção de intelectuais espanhóis
citados em reportagem de "El País" de 3 de
janeiro, para quem o principal objetivo do texto impresso
para jovens deve ser o prazer de ler, não a instrumentalização
didática.
As duas visões parecem opostas, mas são complementares.
É difícil conjugá-las, mas não
impossível. E os dois semanários deste jornal
o têm conseguido com frequência.
Graficamente, eles parecem tentar, como outros veículos
e a Folha inteira, mimetizar a internet, seu ziguezague que
constrói uma cornucópia de palavras, imagens
e símbolos, e reproduzir o ambiente de multitarefas
que caracteriza a atividade do jovem diante da tela.
Se a tática funciona é um tema em aberto. Acho
que não. Mas careço de comprovação
empírica para o meu palpite.
O que assusta é a aparente pouca importância
que o jornal dá ao assunto. Para medir o seu grau de
relevância para ele, encaminhei à Secretaria
de Redação dez perguntas.
Recebi uma resposta só, curta, sob o argumento de que
a maioria das informações solicitadas é
sigilosa.
"A Folha acredita que a melhor forma de atrair o público
jovem é produzir, diariamente, um jornal melhor, independente,
mais completo, aprofundado e com a preocupação
de ser crítico e plural. Todos os dias e em todos os
seus cadernos, busca trazer diferentes aspectos da realidade."
É uma declaração, em minha opinião,
desanimadora. Em vez de concentrar esforços e recursos
para chamar para si os jovens, o jornal parece preferir esperar
que eles sozinhos, ao amadurecerem, venham a substituir seus
pais e avós como leitores, apesar das indicações
de que tal reposição não está
acontecendo.
Vários jornais pelo mundo preferiram caminho diferente
e estão investindo pesadamente na conquista do leitor
jovem via papel e internet e com o auxílio da escola.
Espero que a Folha os estude e siga seu exemplo.