Não
há área de ensino no Brasil em que as meninas
não estejam dominando --ou muito próximas disso.
Elas são maioria no ensino superior, têm taxas
de evasão e reprovação menores no ensino
médio e se saem melhor do que os meninos em quase todos
os testes que avaliam aprendizado no ensino fundamental. Mas
um setor resiste a essa supremacia: o aprendizado de matemática.
Esse quadro não é exclusivo do Brasil. Dos
42 países avaliados no Pisa (exame da Organização
para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico
que analisa o desempenho de alunos), os meninos foram melhor
em matemática em 33.
Em alguns casos, a diferença não é estatisticamente
significativa, mas, em 12 deles, não há dúvidas
de que as meninas estão aprendendo menos. Já
nos oito casos em que a diferença é a favor
das meninas, em um deles, a Albânia, ela é significativa.
O Brasil aparece com destaque na tabela comparativa em matemática
porque aqui a diferença a favor dos meninos é
a maior entre todos os países analisados, ao lado de
Áustria e Coréia do Sul. Esse melhor desempenho
masculino, no entanto, não se repete em todas as áreas.
Pelo contrário, em testes de leitura, a situação
se inverte e a supremacia feminina é incontestável
em todos os países.
Razões
Foi esse quadro que instigou os pesquisadores Márcia
Andrade, Creso Franco e João Pitombeira de Carvalho,
da PUC-RJ, a buscar razões que nos levam a ter uma
das maiores diferenças do mundo em matemática.
O trabalho foi apresentado no 15º Encontro Nacional de
Estudos Populacionais, que aconteceu na semana passada em
Caxambu (MG).
Estudos sobre essas diferenças têm gerado debates,
principalmente quando se discute se essas diferenças
são fruto de aspectos culturais ou biológicos.
O estudo da PUC quis verificar se variáveis socioeconômicas
ou do ambiente escolar explicavam o resultado. Eles trabalharam
com dados do Saeb (exame que avalia a qualidade) no último
ano do ensino médio. Como o Pisa, ele mostra significativas
diferenças a favor dos meninos em matemática.
A primeira hipótese era se o melhor desempenho não
era causado pelo fato de muitos dos meninos mais pobres abandonarem
a escola antes de completar o ensino médio, algo menos
intenso entre meninas.
Isso se justifica porque o que mais interfere no desempenho
escolar é o nível socioeconômico. Se há
menos garotos pobres que concluem o ensino médio, espera-se
que, quando é feito um exame entre os que chegaram
lá, a nota média aumente por haver menos alunos
em condições desfavoráveis, que puxariam
a média para baixo.
Para evitar que isso influenciasse no resultado, a pesquisa
só comparou estudantes de mesmo nível socioeconômico
e que estavam na mesma escola. Os dados mostraram que a distância
entre eles e elas diminuiu, mas, ainda assim, meninos se saíam
melhor.
Iguais
O segundo passo foi separar escolas que atendem crianças
de baixo poder aquisitivo das onde os alunos têm nível
socioeconômico mais alto. A partir daí, constatou-se
que, nas escolas onde estudam os mais pobres, a diferença
persistia.
No entanto, nas escolas para alunos de renda mais alta, a
diferença se torna desprezível, com meninos
e meninas tendo quase o mesmo desempenho.
Uma hipótese é que, nesse ambiente, as famílias
apóiem e aceitem mais o interesse de meninas pela matemática.
"Freqüentemente estão em condições
materiais e ideológicas mais favoráveis para
o rompimento de papéis tradicionais em relação
a gênero", afirmam.
O estudo aponta também que o professor pode ser fundamental
para reverter esse quadro. Em escolas onde havia mais cobrança
de deveres de casa, a diferença diminuía.
Antônio Gois
Vinicius Abbate
Folha de S.Paulo
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