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Artistas portugueses fazem "filosofia selvagem" em galeria
João Maria Gusmão e Pedro Paiva mostram 6 filmes primitivos na Fortes Vilaça
SILAS MARTÍ
DA REPORTAGEM LOCAL
No escuro, um forno-útero
dá à luz uma gota de vidro meteórica. Ovos frigem em tripla
exposição. A sombra, magnética, movimenta fiapos de ferro
numa superfície quase lunar, e
uma cabeça é preparada para a
trepanação -abertura do crânio para expurgar demônios.
Autodidatas, os artistas portugueses João Maria Gusmão e
Pedro Paiva dizem fazer "filosofia selvagem" na primeira individual que montam no Brasil,
em cartaz no galpão da galeria
Fortes Vilaça, na Barra Funda.
Depois de passar pela última
Bienal de São Paulo, em 2006,
além da última edição da Bienal
do Mercosul, eles mostram seis
novos filmes em 16 mm, projetados num cubo negro.
São reflexões visuais sobre o
espocar da existência, algo de
origem desconhecida que se dá
como fenômeno físico em escala imensurável -é tortuoso
mesmo o raciocínio. "Tem a ver
com o estudo científico dos meteoros", diz Gusmão. "Eles vão
do infinito vazio ao cheio."
Como um meteoro surge na
atmosfera, a gota de vidro fundido surge, num dos filmes, do
fogaréu indistinto do forno. A
cirurgia de abertura no crânio,
típico em povos primitivos da
Antigüidade, recorta uma saída
física para um mal só metafísico. Da mesma forma, três ovos
diferentes parecem fritar juntos num filme cujas três seqüências foram gravadas no
mesmo negativo, em tentativa
de ilustrar o princípio esotérico
de colocar no mesmo tempo e
espaço eventos não-correlatos.
Embora feitos agora, os filmes em 16 mm carregam o peso
de uma estética datada, como
se encontrados numa escavação arqueológica audiovisual.
"Não é que temos uma relação
ruim com a tecnologia", explica
Gusmão. "Mas somos avessos à
produção de cultura contemporânea, nada no nosso cinema
pode ser consumido."
No que chamam de anacronismo cintilante, Gusmão e
Paiva fingem voltar no tempo
para resgatar valores perdidos.
JOÃO MARIA GUSMÃO
E PEDRO PAIVA
Quando: de ter. a sex., das 10h às
19h; sáb., das 10h às 17h; até 27/9
Onde: Fortes Vilaça (r. James Holland, 71, tel. 3392-3942; livre)
Quanto: entrada franca
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