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ANÁLISE
O clássico copo meio cheio, meio vazio
DO COLUNISTA DA FOLHA
É preciso levar em conta a evolução das negociações comerciais
globais para matizar o sucesso ontem alcançado em Genebra.
A Conferência Ministerial da
OMC, máxima instância da instituição, ao se reunir em Doha, em
2001, marcou para fevereiro de
2003 a definição das modalidades
da negociação agrícola, o item
principal para o Brasil e que vinha
emperrando qualquer avanço.
"Modalidades" é uma espécie de
pré-negociação, que define seus
contornos, mas não os resultados.
O prazo foi ultrapassado sem
sequer uma aproximação entre os
países ricos que são os que protegem fortemente seus agricultores,
doando-lhes algo em torno de
US$ 1 bilhão por dia, e os grandes
exportadores agrícolas, como o
Brasil. Em setembro de 2003, novo fracasso, em Cancún.
O que se alcançou agora em Genebra é o que deveria ter sido concluído há 17 meses. Caso clássico
em que se pode dizer que o copo
está meio vazio (devido ao atraso)
ou meio cheio (porque o risco era
de que mais um prazo fosse ultrapassado sem acordo).
Vai mais ou menos nessa linha o
próprio chanceler brasileiro, Celso Amorim, em declarações à
agência France Presse: "Melhoramos muito em relação a ontem
[sexta-feira] e ao primeiro projeto
esboço da OMC [de 16 de julho]".
Conforme o ângulo que se olhe, o
copo pode estar mais vazio que
cheio. Afinal, o atraso na negociação das modalidades (agora rebatizadas para "framework" ou
moldura) vai impedir que se cumpra o prazo (janeiro de 2005) para
a conclusão total das negociações,
conforme definido em Doha.
O acordo de ontem assume oficialmente que o prazo não será
cumprido, ao jogar para maio de
2005 o prazo para apresentação
de ofertas melhoradas em serviços. Por isso, o ministro Amorim
usa apenas "satisfatório" para
classificar o acordo, o que é natural: "Em alguns pontos avançamos 20%, em outros 70% e em
outros 90%". Para um país que
ambicionava 100%, pelo menos
em agricultura, o copo fica mesmo meio vazio, mas mais cheio do
que nas duas outras grandes negociações em que o Brasil está envolvido (Área de Livre Comércio
das Américas e União Européia/
Mercosul, em que os impasses
permanecem fortes). Fracassar
também na OMC era um risco
que a diplomacia brasileira não
poderia correr. Sob esse aspecto,
o copo pode até ser dado como
mais cheio que vazio.
(CR)
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