São Paulo, domingo, 01 de dezembro de 2002

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JANIO DE FREITAS

Boas novas

A melhor novidade até agora resultante da eleição de Luiz Inácio Lula da Silva não mereceu no jornalismo político mais do que o tratamento comum aos assuntos de dia a dia. A novidade está nos dois princípios fixados para o preenchimento de cerca de 20 mil cargos na administração federal, princípios capazes de gerar efeitos amplos e benéficos para toda a população e para a eficácia de toda atividade produtiva. E ainda impor uma transformação moralizante na política, nos partidos e no Congresso.
O preenchimento de cargos, em um mesmo ministério, por pessoas de diferentes ligações partidárias ou sem ligação alguma, acaba com o sistema - como logo notou Tereza Cruvinel, muito mais atenta e preparada do que o padrão do jornalismo político - de posse vertical e integral de um ministério pelo partido do seu ministro. Transformados, desde o fim do regime militar, em instrumentos eleitorais com ramificações pelo país todo, os ministérios afinal deixam de sê-lo. Devem começar a ser apenas ministérios.
Dessa observação deve-se deduzir outra de igual importância: o sistema de negociação fisiológica e mercantil, entre governo e partidos negociadores do seu apoio, perde o sentido. Fazer um ministro ganha significado político e proporciona projeção partidária, em lugar dos favorecimentos diversos que têm aviltado a política e o Congresso. Logo, os partidos fisiológicos que têm predominado estarão forçados a se aproximar, com o tempo, do que são partidos políticos.
Se esvaziadas as razões fisiológicas e negociais para rechear a espinha dorsal dos ministérios, já daí poderia advir alguma melhoria na máquina administrativa. Tal possibilidade se engrandece, porém, com o segundo princípio estabelecido para as nomeações: serão, preferentemente, colhidas no próprio funcionalismo publico. É o pessoal que conhece a máquina da burocracia, sabe como lhe dar eficiência e inclui um corpo de técnicos capazes, em todos os setores. Apesar disso, desvalorizado e desprestigiado.
A recuperação do serviço público como carreira é indispensável para dotar o Brasil do único dispositivo, como se vê em todos os países desenvolvidos, capaz de dar à estrutura da administração pública a eficiência permanente, do alto a baixo, e inabalável com mudanças de governo ou períodos problemáticos. Nas razões do crescimento espantoso alcançado por Coréia do Sul, Tailândia e outros asiáticos, enquanto o Brasil ficou patinando, é sempre destacada a importância da estrutura e do sentido profissional dados ao serviço público, como ativador dos projetos públicos e privados.
Medidas de Roberto Campos no Planejamento, entre 64 e 67, começaram a extinguir o sentido de carreira, até de simples profissão, no serviço público. No governo Fernando Henrique tudo se passou como se a meta fosse extinguir o próprio serviço público, pela extinção do servidor acossado por arrocho de oito anos, aumento das deduções, os anos do terrorismo de Bresser Pereira, a sustação das atividades por corte de verba e tanto mais.
Retirar pelegos políticos da máquina administrativa será um avanço promissor. Devolvê-la aos servidores públicos pode dar início a uma nova visão da importância, para a população e para o país como todo, de um serviço público reconhecido como tal.

O método
Caso o embaixador Celso Amorim venha a ser ministro das Relações Exteriores, como os jornais noticiam, terá sido caso único até agora. O de alguém convidado publicamente para conversar com Lula da Silva, em meio à operação sigilo total, e tornar-se ministro. O método tem sido outro, e nem começa pelo próprio presidente eleito. (O embaixador, aliás, negou o convite).
Aos que chegam a ser convidados não é poupada a advertência de que a discrição deve ser plena - embora isso não impeça que um ou outro não a tenha, guardadas certas cautelas.



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