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MANDATO INTERROMPIDO
Alteração na lei afasta governantes com mais rapidez
Corrupção eleitoral leva 72 prefeitos do país à cassação
RANIER BRAGON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Um procedimento inédito adotado pelos tribunais eleitorais do
país levou 72 prefeitos eleitos em
2000 a serem cassados ou afastados por irregularidades cometidas durante as campanhas.
A principal causa é a corrupção
eleitoral, caracterizada pelo oferecimento de dinheiro, mercadorias, benefícios ou promessa de
ajuda futura em troca do voto.
Levantamento feito pela Folha
nos 26 Tribunais Regionais Eleitorais dos Estados mostra que a
compra de votos ocorreu de diversas formas. Revela também
que PTB, PSDB e PMDB concentraram o maior número de casos,
66,7% do total, apesar de terem
eleito apenas 47,6% dos prefeitos.
O PTB é, proporcionalmente, o
partido responsável pelo índice
mais alto de cassados e afastados
-3% de seus prefeitos eleitos
perderam o cargo. O PSDB (1,7%)
e o PMDB (1,5%) vêm em seguida. O PT, que elegeu 187 prefeitos,
não aparece em nenhum caso.
Uma análise mais detalhada dos
processos mostra como foram variadas as práticas que levaram às
condenações, que raramente
eram aplicadas, antes de 2000, durante o mandato do condenado.
Em Campos Borges (RS), por
exemplo, a acusação sustenta que
o candidato distribuía aos eleitores notas de R$ 50 partidas ao
meio. A promessa era de entrega
da outra metade após a abertura
das urnas (leia texto ao lado).
Ouvidos pela Folha, os prefeitos
condenados negam as acusações
e atribuem as decisões a erros da
Justiça e à perseguição política.
Apesar de as práticas de corrupção eleitoral não se restringirem
às eleições de 2000, a efetiva punição, que é a perda do mandato, só
foi possível graças a uma mudança na legislação eleitoral, em 1999,
e na posterior atualização da interpretação das leis pelos tribunais (leia texto nesta página).
"Temos hoje a eficácia da Justiça Eleitoral. Antes, era uma brincadeira, não havia combate à corrupção eleitoral, os instrumentos
jurídicos eram completamente
ineficazes", afirma Delosmar
Mendonça Júnior, presidente da
Comissão de Direitos Políticos da
OAB (Ordem dos Advogados do
Brasil). "O que havia era uma série de exigências que inviabilizavam a punição", acrescentou o
ministro Nelson Jobim, que presidiu o TSE (Tribunal Superior
Eleitoral) entre 2001 e 2003.
Os dados fornecidos pelos TREs
mostram que, dos 72 casos, 48
ocorreram em cidades com menos de 20 mil habitantes. Em relação aos demais, o maior município é Macaé (RJ), com 132.461 habitantes. Na divisão dos casos por
partidos, o PFL e o PP tiveram, cada um, 0,8% de seus prefeitos eleitos cassados. Alguns dos 72 casos
ainda estão em fase de recurso e
pode haver revisão da decisão.
O levantamento não inclui cassações ou afastamentos motivados por causas não eleitorais, como as tratadas pelas Câmaras ou
pelos Tribunais de Justiça.
Outros três casos curiosos ocorreram em Cajamar (SP), Jussiape
(BA) e Cambuquira (MG). Na cidade paulista, o prefeito Antonio
Carlos Oliveira Ribas de Andrade
(PTB) foi condenado por custear
as despesas de eleitores para a obtenção de carteira de motorista.
Foram encontrados bilhetes assinados pelo então prefeito-candidato encaminhando eleitores a
uma auto-escola de um conhecido. Ele venceu a eleição por 13 votos de diferença, em uma cidade
com mais de 50 mil habitantes.
Na cidade baiana de Jussiape, o
prefeito Sílio Luz Souza (PMDB)
foi cassado pela acusação de compra de um voto -a doação de
uma caixa d'água e um padrão de
luz a uma eleitora. A situação levou a cidade, de pouco mais de 10
mil habitantes, a ter quatro prefeitos no segundo semestre de 2002.
O cassado deu lugar ao segundo
colocado, que foi afastado dois
meses depois devido a novo entendimento da Justiça Eleitoral
determinando novas eleições. O
presidente da Câmara, o terceiro a
ocupar a prefeitura no período,
afastou-se para disputar a eleição
dando lugar a uma vereadora.
"Jussiape é um caso à parte no
mundo. Lá, um mosquito vira um
elefante. Se um solta um foguete,
o adversário solta dois", afirmou a
juíza Ana Maria dos Santos Guimarães, da comarca.
Em Cambuquira, o prefeito Rubens Barros Santos (PL) -na
época candidato à reeleição- foi
afastado por repassar a famílias
carentes os recursos federais do
Bolsa-Escola por meio de cheques
da prefeitura assinados por ele,
semanas antes das eleições.
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