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Gil levou escritor para ver Carnaval
DO ENVIADO ESPECIAL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Gastos com um convidado estrangeiro durante o Carnaval,
reuniões de assessores de Antonio Palocci Filho (Fazenda) em
Ribeirão Preto (SP) e até uma claque paga com recursos públicos
para "assistir ao pronunciamento
do sr. presidente da República",
em Brasília, são revelados pelos
relatórios das passagens aéreas
emitidas pelos ministérios entregues ao Congresso Nacional entre
março e abril últimos.
O Ministério da Cultura bancou
as passagens aéreas de um escritor amigo do ministro Gilberto
Gil, um "novo pensador" da cibernética, como o definiu o próprio Gil numa palestra em 2003,
John Perry Barlow, 56. A justificativa que consta do relatório enviado ao Congresso é a seguinte:
"Conhecer e participar com o sr.
ministro o nosso Carnaval".
Na qualidade de "colaborador
eventual", Barlow cumpriu o roteiro Nova York-Rio de Janeiro-Salvador-São Paulo-Salvador-Nova York entre 24 de fevereiro e
13 de março. A viagem, segundo o
relatório, normalmente custaria
R$ 17,8 mil, mas ganhou um desconto e saiu por R$ 3.120.
No Brasil, Barlow enviou um e-mail para os Estados Unidos relatando impressões sobre a viagem.
A mensagem foi colocada em seu
site. "O povo do Brasil ama Gilberto Gil. Sem exceção. Eles não o
amam mitologicamente, como os
fãs amam [o cantor] Elvis Presley,
ou [o roqueiro] Jerry Garcia, ou [o
ex-presidente americano] John
Kennedy. [...] Eu o amo também.
Eu me sinto melhor a respeito da
raça humana ao saber que nós podemos ocasionalmente produzir
um Gilberto Gil."
Em outro texto, Barlow explicou estar "trabalhando com Gilberto Gil, ministro da Cultura do
Brasil, num esforço para colocar
toda a música brasileira online".
"Também estou envolvido em
projetos embrionários voltados à
criação de um novo tipo de indústria musical." Ao receber e-mail
da Folha, Barlow disse estar disposto a falar sobre qualquer coisa
do seu "herói Gil". A reportagem
enviou três perguntas, mas não
houve retorno até o final da noite
de anteontem.
O Ministério da Cultura também promoveu outras viagens
sem similar nas centenas de páginas de outros ministérios. Custeou as passagens de 33 cineastas
e profissionais de artes visuais para comparecer a um pronunciamento do presidente Luiz Inácio
Lula da Silva no Palácio do Planalto, em Brasília. Tratava-se de um
discurso sobre a política governamental na área do cinema. A caravana custou aproximadamente
R$ 23 mil só com as passagens -é
provável que todos tenham ganho
também diárias para gastos com
alimentação e hotel na capital.
Em uma justificativa para uma
viagem sua ao Rio, Gilberto Gil
anotou, sem subterfúgios: "Cumprir compromissos pessoais".
Na Secretaria de Comunicação,
o ministro Luiz Gushiken também deixou claro o objetivo de
quatro viagens suas a Campinas
(SP): "Deslocamento para residência permanente". As viagens,
feitas em vôo de carreira, custaram ao todo R$ 5.000.
No final do ano, a saída de ministros de Brasília foi intensa. Às
vésperas do Natal, Ciro Gomes
(Integração Nacional) foi a Fortaleza (CE), seu reduto eleitoral.
"Viagem oficial ao Estado do
Ceará", foi a justificativa apresentada. O site de Ciro na internet é
um dos poucos que possibilitam a
consulta de agendas passadas. No
sistema, não há nenhum compromisso anotado nos dias 23, 24, 25,
26, 27, 28 e 29 de dezembro.
A julgar pelas viagens de assessores do alto escalão do ministro
Antonio Palocci Filho, o Ministério da Fazenda tem assuntos importantes a tratar com a Prefeitura de Ribeirão Preto (SP) e o escritório da Receita Federal da cidade.
"Assessor particular" de Palocci, segundo informou a assessoria
do ministro, Ademirson da Silva
esteve seis vezes na sede da Receita no município. Não há registro
de nenhuma outra reunião em
outro escritório do órgão em todo
o território nacional. Ao todo, Silva esteve 24 vezes em Ribeirão no
ano passado, sempre com passagens pagas pelo governo federal.
Sobre essas viagens, a assessoria
do ministério informou que elas
foram feitas com o objetivo de
"tratar de assuntos do governo".
Indagada sobre detalhes desses
assuntos, a assessoria não havia
enviado resposta até o final da
noite de anteontem. O chefe-de-gabinete de Palocci, Juscelino
Dourado, também foi três vezes a
Ribeirão em 2003. Em contrapartida, não há viagem em vôo comercial de Palocci para a cidade
onde foi prefeito.
(RV e EDS)
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