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Iniciativa como a de promover o 7 de Setembro satisfaz base de apoio
Para estudiosos, nacionalismo do governo exclui a economia
EDUARDO SCOLESE
JULIA DUAILIBI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O governo do presidente Luiz
Inácio Lula da Silva abriu uma polêmica nas comemorações em
torno do 7 de Setembro deste ano
ao tentar "estimular", tanto no
empresariado como na população, um sentimento nacionalista.
Nesta terça-feira, diante de um
público esperado de 50 mil pessoas, Lula desfilará em carro aberto na Esplanada dos Ministérios,
em Brasília. A figura do presidente da República será uma das estrelas de um evento nacional.
Para intelectuais ouvidos pela
Folha, o governo adotou um discurso nacionalista que satisfaz sua
base de apoio, mas, na condução
da economia, por exemplo, não
leva isso em conta. A gestão Lula
tenta aproveitar também a data
comemorativa da independência
do país e capitalizar para si uma
onda de sentimento nacional.
"O governo apresenta uma certa derrapagem nacionalista que
eu não vejo no conjunto articulado de medidas. É nacionalista no
discurso, mas não é ao discutir
com o FMI, por exemplo. A política nacionalista repercute como a
tábua de salvação ideológica. É
como se dissesse: "Não somos tão
incoerentes'", afirmou Denis Rosenfield, que é professor titular de
filosofia da UFRGS (Universidade
Federal do Rio Grande do Sul).
Na tentativa de popularizar o 7
de Setembro e aumentar o espírito cívico da população, o governo
federal pediu neste ano o apoio de
empresas, para que, por exemplo,
confeccionassem camisas e bandeiras sobre o tema. No ano passado, Lula já havia tirado o desfile
das proximidades do Quartel General do Exército, levando a parada à Esplanada dos Ministérios.
Wálder de Góes, professor aposentado de ciência política da
UnB (Universidade de Brasília),
afirmou que, apesar de as ações
em busca da "popularização" do 7
de Setembro serem positivas, elas
devem ser vistas com cautela.
"Esse tipo de condução político-simbólica exige uma administração fina para não cair no ridículo.
Você pode fazer manifestações
nacionalistas e patrióticas, e não
fazer a bobagem, por exemplo, de
expulsar um correspondente norte-americano [como quis fazer o
governo em maio passado]."
Para o historiador Jaime Pinsky,
os símbolos nacionais ainda são
relacionados hoje à ditadura militar (1964-1985) e, por isso, acabam causando um certo sentimento de rejeição na população,
principalmente entre os adultos.
"Retornar aos símbolos pode
ser útil porque desperta um sentimento de pertinência que aparece
em ocasiões como a Copa do
Mundo", disse Pinsky. "É óbvio
que Lula e sua equipe perceberam
que podem usar isso a favor deles.
Pertencer ao todo é pertencer ao
governo. Tentam fazer com que
se identificar com a nação seja se
identificar com o governo."
Relação com o autoritarismo
Góes aponta ainda uma tradição da esquerda de buscar o fortalecimento do aparelho estatal e as
mobilizações para estimular o patriotismo. "O PT tem a tradição
autoritária da esquerda que se
manifesta agora. Mas não vejo,
por enquanto, uma relação entre
o nacionalismo e o autoritarismo", acrescentou Rosenfield.
Integrantes do governo Lula defendem que o país precisa ter força militar, política, tecnológica e
econômica para alcançar o desenvolvimento. O ministro da Casa
Civil, José Dirceu, que é um dos
partidários dessa tese, já a manifestou, inclusive, publicamente.
"Não me parece que esse seja o
tom de todo o governo, e, sim, o
de alguns integrantes dele", declarou a professora Maria Hermínia
Tavares de Almeida, do Departamento de Ciência Política da USP.
Nos dias anteriores à comemoração, o governo também passou
a veicular nas televisões campanhas publicitárias sobre a data.
"Acho precipitado afirmar que
o governo está reforçando a tecla
nacionalista. Independentemente
do que diz, não me parece que o
governo, por sua política econômica atual, tenha escolhido o nacionalismo como uma opção",
concluiu a professora da USP.
Para os acadêmicos, ainda é frágil buscar ligação direta entre nacionalismo e autoritarismo, tido
por alguns como uma faceta do
governo Lula. "Não necessariamente [o nacionalismo] é perigoso ou haja uma ligação com o viés
autoritário. Em países ocidentais
com a democracia consolidada, é
natural que os símbolos nacionais, como a bandeira e o hino, sejam valorizados", disse Pinsky.
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