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GENTE QUE REGA
Fruta que povoa discurso do presidente tem história na vida nacional
Lula no país das jabuticabas
VINICIUS MOTA
DA REPORTAGEM LOCAL
Lula, Marisa, o conselhão e a
jabuticabeira. Na quinta-feira,
eles voltaram a se juntar: "Está
acontecendo com o meu pé de
jabuticaba o que vai acontecer
com a economia nacional", disse o presidente da República.
Dessa vez Lula se referia a uma
jabuticabeira do Palácio da Alvorada. Quando fez o discurso
que inaugurou os trabalhos do
Conselho de Desenvolvimento
Econômico e Social (CDES), em
fevereiro, Lula louvou a perseverança de sua mulher, Marisa
Letícia da Silva, que conseguiu
fazer frutificar jabuticabas num
vaso de apartamento em curto
lapso de tempo.
A jabuticabeira e o seu fruto
têm presença constante no conjunto de metáforas que assola o
país. O que geralmente está em
discussão quando alguém menciona o fruto negro da árvore da
família Myrtaceae são as peculiaridades brasileiras.
"Se só existe no Brasil e não é
jabuticaba, desconfie", reza o
ditado. O economista Winston
Fritsch, um dos formuladores
do Real, foi ao ponto, em 1996:
"Quando falam que o Brasil tem
alguma coisa diferente dos outros países que não é jabuticaba,
então é besteira." A frase ilustra
uma apropriação simbólica frequente da jabuticaba: se o país
burlar os padrões do mundo
globalizado, acabará mal.
Jabuticaba é peculiaridade
brasileira. Originou-se no centro-sul do país. Depois propagou-se, antecipando-se ao sonho geopolítico de Lula: é plantada em toda a América do Sul.
Há os que combatem o "adapte-se ao mundo ou pereça" lançando mão da mesma jabuticaba. Foi o caso de Policarpo Quaresma, o personagem ultranacionalista do escritor Lima Barreto (1881-1922).
A visão das "jabuticabas negras a estalar dos caules rijos"
ajudou o herói, que saía do hospício, a refazer o ânimo e a buscar a realização de sua utopia no
cultivo da terra. Infelizmente lá
o aguardavam as saúvas.
Vinicius de Moraes (1913-1980) se insurgiu contra o materialismo abastado dos ricos invocando a árvore nacional. Em
"Olhe aqui, Mr. Buster", ele se
vinga de um milionário americano: "O sr. sabe lá o que é ter
uma jabuticabeira no quintal?"
O presidente Lula está interessado em explorar outros flancos
para as metáforas relacionadas à
jabuticaba. Na campanha, instado a reagir a uma provocação de
Ciro Gomes, disse que seu adversário e o governo FHC eram
"jabuticaba do mesmo pé". Em
seu lugar, outros usariam o clássico "farinha do mesmo saco".
Já nos discursos aos conselheiros do CDES, a árvore representa o crescimento econômico.
Como uma jabuticabeira em
ambiente hostil, o desenvolvimento, para acontecer, requer
cuidados especiais e paciência.
Frutos vigorosos e safras frequentes, pontifica Lula, recompensarão os sacrifícios iniciais.
É característica da jabuticabeira, explica Rolf Puschmann, da
Universidade Federal de Viçosa
(MG), a velocidade espetacular
com que da flor surge o fruto
maduro (30 dias). Ocorre que
jabuticabas fenecem rapidamente, quanto mais se colhidas.
Crescimentos intensos que duram pouco, na economia, são
chamados de "bolhas".
Por outro lado, também marca essa planta o seu lento processo de crescimento, diz à Folha Luiz Carlos Donadio, da
Unesp de Jaboticabal (SP).
Da semente até que a árvore
produza os primeiros frutos decorrem ao menos dez anos, ou
2,5 mandatos presidenciais. A
solução para abreviar esse processo para algo em torno de seis
anos, ou 1,5 mandato presidencial, é a enxertia, uma interferência humana -ou heterodoxa- no processo natural.
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