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BRASIL PROFUNDO
Até órgãos admitem o sucateamento; trabalho de prevenção a conflitos praticamente não existe
Tensão no campo fica à mercê da falta de estrutura de órgãos
EDUARDO SCOLESE
IURI DANTAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Sucateados, os órgãos do governo federal responsáveis pelos trabalhos de prevenção e controle
das tensões que envolvem sem-terra, índios, milícias de fazendeiros e trabalho escravo não têm estrutura para atender à atual demanda no campo. O trabalho de
prevenção praticamente inexiste.
A situação é admitida na Polícia
Federal, no Ministério do Trabalho, na Ouvidoria Agrária Nacional (subordinada ao Ministério
do Desenvolvimento Agrário) e
na Funai (Fundação Nacional do
Índio). Faltam recursos até para
viagens de fiscalização. O número
de funcionários é insuficiente.
O quadro verificado na Polícia
Federal é relatado pelo próprio
coordenador-geral de defesa institucional, delegado José Milton
Rodrigues. Segundo ele, a corporação mantém operações engavetadas por falta de verbas, enquanto policiais são obrigados a "financiar" viagens a serviço.
"O nosso pessoal, não é segredo,
tem praticamente financiado as
viagens de serviço do próprio bolso. Chega ao ponto de funcionários, sem dinheiro, se recusarem a
viajar", afirma Rodrigues.
A PF é responsável pelo serviço
de inteligência em torno da formação de milícias armadas e da
movimentação de índios e sem-terra, um trabalho chamado internamente de "monitoramento".
A instituição também atua na
repressão a conflitos já instalados.
No ano passado, a Operação Paz
no Campo conseguiu, em duas
ocasiões, apreender armas ilegais
em fazendas na região central do
Paraná e no Pontal do Paranapanema (extremo oeste de SP).
A Polícia Federal também atua
dando apoio às equipes de auditores do Ministério do Trabalho
na fiscalização de fazendas sob
suspeita de abrigar funcionários
em condições análogas à escravidão. Nesses casos, porém, os custos de hospedagem e alimentação
dos policiais são suportados, há
cerca de oito anos, pelo Trabalho.
Três em um
Segundo a secretária de Inspeção do Trabalho, Ruth Vilela, a
experiência da fiscalização demonstra que, onde se encontra
ocorrência de trabalho escravo,
haverá conflitos fundiários e problemas de exploração do meio
ambiente. Daí a necessidade de
ação conjunta.
Na avaliação de Vilela, o número de auditores fiscais hoje "não é
suficiente". No caso específico do
combate ao trabalho escravo, a situação é mais precária. Há cerca
de cem fiscais. Todos voluntários.
Para melhorar o trabalho, seria
necessário aprovar a lei que determina a expropriação de terras em
que for constatado trabalho escravo, diz a secretária.
"Em algumas regiões, para ganhar agilidade e eficácia, não podemos ir por terra e não temos helicóptero", diz Vilela.
Criada em 1999 para prevenir e
diminuir os conflitos entre fazendeiros e sem-terra, a Ouvidoria
Agrária Nacional, ligada ao Ministério do Desenvolvimento
Agrário, conta hoje com uma
equipe de quatro pessoas em todo
o país. Apenas duas são consideradas "mediadoras" de conflitos,
ou seja, que atuam, por exemplo,
nas negociações após uma invasão de terra. Em 2003 foram 222
invasões no Brasil.
A ouvidoria diz contar hoje com
o apoio de 13 ouvidores agrários
subordinados aos Estados. "Precisamos estruturar a ouvidoria
com mão-de-obra qualificada",
Para a Polícia Federal, a tensão
relacionada aos índios é atualmente a principal preocupação,
acima dos sem-terra. Para controlar tais focos, como em Roraima e
em Mato Grosso do Sul, a Fundação Nacional do Índio conta com
cerca de 20 antropólogos sediados em Brasília. Deslocam-se apenas quando em caso de conflitos.
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