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São Paulo, domingo, 09 de março de 2003

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Paulo Costa Leite defende sua atuação no STJ após aposentadoria

Ex-ministro diz que não pode ser comparado a um "safado"

DA REPORTAGEM LOCAL

O ex-presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Paulo Costa Leite, 54, se aposentou há menos de um ano e advoga em mais de 20 ações no tribunal.
"Você não pode comparar alhos com bugalhos. Não pode comparar uma pessoa que tem 30 anos de formado, que foi presidente do STJ, como eu fui, com um menino, filho de não sei quem, que é safado. É diferente", afirmou, referindo-se às denúncias de tráfico de influência que estão sendo apuradas no STJ.
Após deixar o tribunal, em 2002, quando se tornou pré-candidato a vice-presidente da República pelo PSB, Costa Leite se impôs um quarentena de quatro meses "para evitar que houvesse qualquer tipo de cobrança ou crítica".
O ex-presidente do STJ disse que já atuou, como advogado, em processo no qual três "amigos" seus ministros votaram contra sua posição. "Cada um tem a sua convicção." Leia a entrevista.
 
Folha - O que o sr. acha da atuação de ministros aposentados nas cortes em que trabalhavam?
Paulo Costa Leite
- O ministro aposentado continua sendo um profissional. Eu sou um bacharel em direito, sou advogado. Pelo fato de me aposentar, no meu caso, por exemplo, com 53 anos, fico condenado a não exercer mais a minha profissão? Não pode ser.
Mas acho que quem advoga não deve frequentar o tribunal a não ser na sala de sessões e nos gabinetes para levar o memorial quando tiver o julgamento.

Folha - Há outro tipo de frequência?
Costa Leite
- Tem a sala de aposentados e o lanche que o aposentado pode frequentar [onde também vão ministros da ativa". Mas essas prerrogativas dizem respeito a aquele aposentado que não está no exercício da advocacia. Quem está no exercício deve ser tratado como advogado e não como ministro aposentado.

Folha - O sr. comparece a essas reuniões e lanches?
Costa Leite
- Não. Se eu quiser, posso ir. Eu, por exemplo, que advogo, não compareço. Justiça seja feita com todos os aposentados: desconheço quem esteja advogando que compareça. Quem comparece é ministro que se aposentou e que está inativo.

Folha - O sr. é a favor da quarentena para quem deixa o tribunal?
Costa Leite
- Sou a favor. Mas sempre é uma questão difícil de mensurar. Aos juízes pouco importa quem esteja postulando. Aceito a idéia da quarentena porque acho que é importante para as pessoas que estão de fora. É mais para proteger os juízes das pessoas que estão fora que formam um conceito equivocado.

Folha - Mas não seria melhor atuar em outro tribunal?
Costa Leite
- Mas, no meu caso, que moro em Brasília, onde vou atuar? Se eu não atuar no Supremo e no STJ, é melhor fechar o escritório. Na causa mais importante que tenho no STJ, os meus três amigos votaram contra mim. São do Rio Grande do Sul, meu Estado, meus amigos, meus irmãos. Cada um tem a sua convicção. Eles votaram contra a tese.

Folha - O sr. fez quarentena?
Costa Leite
- Eu me impus. Não precisava. Não há lei que determine isso. Mas, para evitar que houvesse qualquer tipo de cobrança ou crítica, eu usei a quarentena do Executivo, que é a única que existe. Aí eu me impus quatro meses, apenas para não dizer que "o cara saiu da presidência do tribunal e já está advogando".

Folha - Os clientes que o procuram comentam sobre sua condição de ex-ministro?
Costa Leite
- Não tem dúvida. Não posso me despir da minha condição de ex-presidente do STJ. Mas isso aí me dá confiabilidade, credibilidade. Não significa que eu vou ganhar todas as minhas ações. Se for olhar no STJ, verá que já perdi ações. É normal que isso aconteça. Não há nenhum tipo de dificuldade extra em relação a outros advogados que têm bom trânsito no tribunal. Advogados que trabalham há 30 anos estão na mesma condição.

Folha - O sr. se encontra com os seus ex-colegas socialmente?
Costa Leite
- Claro. Sem o menor problema, meu Deus.

Folha - Isso não lhe confere uma situação privilegiada?
Costa Leite
- Não, porque nessas situações eu jamais falo de serviço. Não sei se é uma questão ética minha, mas posso te garantir. Se vou no aniversário na casa de um colega, não falo em processo por nada desse mundo. Acho que a minha dignidade profissional também está em jogo aí.

Folha - Não seria o caso de restringir o exercício profissional no tribunal em que atuou?
Costa Leite
- Não há possibilidade disso. Se fizer isso, é uma loucura. Por que só o advogado? E os outros profissionais? Por que não pode acontecer contigo? Por que tem de ser comigo, advogado, que tenho de pagar esse preço pela profissão? O que temos de respeitar são os limites éticos. Lamentavelmente há pessoas que não têm a menor condição ética. É diferente. Você não pode comparar alhos com bugalhos. Não pode comparar uma pessoa que tem 30 anos de formado, que foi presidente do STJ, como eu fui, com um menino, filho de não sei quem, que é safado. É diferente. Não pode comparar. Isso que dói.



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