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DE OLHOS ABERTOS
Sem infra-estrutura e com poucos mecanismos de apuração, atuação do órgão fica aquém de suas atribuições
Corregedorias são criticadas até por juízes
JULIA DUAILIBI
DA REPORTAGEM LOCAL
JOSÉ ALBERTO BOMBIG
ENVIADO ESPECIAL AO RIO
As Corregedorias do Poder Judiciário, os únicos órgãos responsáveis pela fiscalização e pelo
acompanhamento do trabalho
dos magistrados brasileiros, apresentam problemas de infra-estrutura, dispõem de poucos mecanismos de apuração e são alvo de
críticas do Ministério Público, da
OAB (Ordem dos Advogados do
Brasil) e até mesmo de juízes.
Em tese, os órgãos fiscalizam toda a parte operacional da Justiça,
incluindo funcionários e cartórios, o que os transforma no principal elo entre a sociedade e o Poder Judiciário, mas acusações de
falta de transparência, morosidade e corporativismo permeiam
sua atuação no país.
Das 74 representações feitas
neste ano contra juízes pela OAB-SP no Tribunal de Justiça de São
Paulo, menos da metade obteve
resposta. As que obtiveram, foi a
mesma: arquivamento.
"Nos últimos três anos, não me
lembro de ter recebido uma única
informação que não fosse de arquivamento. Não sei do que os
juízes têm medo. Os processos
contra advogados podem ser
acompanhados pelas partes. Os
contra magistrados, não", afirmou o presidente da Comissão de
Direitos e Prerrogativas da OAB-SP, José Luís Oliveira Lima.
"As apurações e eventuais punições são feitas em segredo de Justiça. Acho que isso deveria vir a
público, estaria dentro do princípio da transparência", declarou o
desembargador Vladimir Passos
de Freitas, ex-corregedor-geral de
Justiça e coordenador do livro
"Corregedorias do Poder Judiciário" (Ed. Revista dos Tribunais).
A Folha solicitou às cinco Corregedorias da Justiça Federal dados sobre a atuação dos órgãos. O
único tribunal a informar o número de processos administrativos abertos, nos últimos dez anos,
foi o da 4ª Região, onde existem
136 varas federais. Os demais não
divulgaram informações ou o fizeram de forma incompleta.
A OAB-SP já chegou a impetrar
mandado de segurança para ter
acesso ao encaminhamento de representação feita contra um juiz
na Corregedoria do TJ paulista.
"A imensa maioria dos juízes
brasileiros é a favor das corregedorias. Mas, por falta de critérios,
elas não funcionam como deveriam. A existência de processos e
o seu resultado final devem ser
públicos. Sigilo, só em certos casos", defende o presidente da Ajufe (Associação dos Juízes Federais), Paulo Sérgio Domingues.
Poucas punições
A relação entre o número de representações oferecidas às corregedorias e o de processos instaurados e penas aplicadas também é
alvo de críticas. Em 2002, em São
Paulo, as 680 representações feitas
para a Corregedoria do Tribunal
de Justiça resultaram em 20 processos e 11 punições. Seis delas são
consideradas leves, como advertência. Há cerca de 1.300 magistrados no Judiciário paulista.
No Tribunal Regional Federal
da 4ª Região, que abrange Rio
Grande do Sul, Santa Catarina e
Paraná, por exemplo, em dez
anos foram abertos 11 processos
administrativos contra magistrados. Três resultaram em advertências e dois em censura, penas
mais brandas previstas pela Lei
Orgânica da Magistratura.
Nos Estados, a situação é semelhante. Pelo menos 9 das 28 corregedorias estaduais do país ainda
não aplicaram penas neste ano,
nem mesmo as mais leves, segundo levantamento da Folha.
O presidente da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República), Nicolao Dino,
diz que "falta vontade política"
aos corregedores para investigar
seus pares. "Os poderes do órgão
são satisfatórios, basta implementar", afirmou o procurador.
As corregedorias não têm competência para fiscalizar a segunda
instância, o que, na opinião de
Freitas, é um dos maiores problemas do Judiciário. "Se, de fato, for
implementada uma reforma
constitucional, é preciso aprimorar os órgãos. A lei orgânica está
desatualizada", diz.
"Os desembargadores, tanto no
âmbito federal quanto no estadual, praticamente não estão sujeitos a nenhum controle", completa o ministro do STJ (Superior
Tribunal de Justiça) Ari Pargendler, coordenador-geral e presidente do Fórum Permanente de
Corregedores da Justiça Federal.
Também não há órgãos corregedores no STJ e no STF (Supremo Tribunal Federal). Atos ilícitos são julgados pelos ministros.
"Vínculos fortes"
O controle de juízes de segundo
grau está previsto nos regimentos
dos tribunais, mas, segundo especialistas, não faz parte da tradição
jurídica brasileira. Infrações penais cometidas pelos desembargadores são analisadas pelo STJ.
"A apuração nem sempre é fácil.
A convivência durante anos, a
aproximação das famílias, a solidariedade nos momentos difíceis
da vida, tudo isso cria vínculos
fortes. É exigir demais, ainda que
não seja impossível, que um colega investigue a falta funcional praticada por outro", afirma Freitas
em trecho do livro.
No TRF da 5ª Região, em Pernambuco, desde 2001, o corregedor pode apurar fatos no segundo
grau, desde que não sejam nos gabinetes de desembargadores.
No Tribunal de Justiça do Ceará, dois desembargadores e dois
juízes foram afastados desde 2001.
Os desembargadores -Ernani
Barreira e Edmilson Cruz-, depois de dois anos, foram reintegrados pelo mesmo tribunal que
os havia punido. Eles haviam sido
afastados sob acusação de venda
de sentenças. Entre os beneficiados estava um narcotraficante.
Colaborou KAMILA FERNANDES, da
Agência Folha
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