|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
JANIO DE FREITAS
Além das miudezas
O insucesso da candidatura de José Serra excede todas as explicações, por mais que algumas sejam fundadas, e se aproxima do imponderável, das razões
tão subjetivas que fogem à apreensão.
A recusa à candidatura, agora
disseminando-se no eleitorado
que chegou a apoiá-la, não se limita a inverter o efeito de fatos
mais favoráveis a Serra do que ao
seu competidor imediato, Ciro
Gomes. O grau de recusa é desproporcional até ao próprio José
Serra, cuja desempenho como político e como ex-ocupante de cargos públicos não é compatível
com rejeição que o ponha no fundo de pesquisas eleitorais.
A nova queda que levou Serra a
empatar com o desprovido e desamparado Anthony Garotinho
em 11 pontos, no último Ibope, seguiu-se a uma série de questionamentos a afirmações de Ciro Gomes, com o propósito de caracterizá-lo como "inconsistente" e "inverdadeiro", segundo as palavras
usadas por José Serra ao lançar a
tática logo adotada e ampliada
pela mídia. Nada de relevante,
chutes típicos de político, miudezas como a inflação em julho de
94, em que colégio Ciro estudou,
quantos dólares valia o salário
mínimo quando Ciro foi ministro
da Fazenda também em 94. Mas
as miudezas deveriam retirar alguns pontos de Ciro. Foi Serra
quem os perdeu, no entanto. Como e por que, não se explicou.
E, pior, a invocação de "inconsistências" e "inverdades" começa
a voltar-se contra Serra, com a
constatação de que o seguro-desemprego não foi criação sua, como tem dito, mas de José Sarney;
não deu ao lançamento do Plano
Real o apoio agora "rememorado", nem foi o senador mais votado do Brasil. Miudezas típicas de
político-candidato.
Mas, já que a mídia entrou neste caminho sugerido por Serra,
não faltarei com a colaboração
devida. E nada de miudezas. No
debate pela Bandeirantes, em que
lançou a tática anti-Ciro, Serra se
referiu a US$ 2 bilhões que o Estado do Rio recebe, como participação na renda do petróleo extraído
de seu território. Nisso se atribuiu
uma contribuição ao Rio, como
parlamentar.
O Brasil se movimenta com o
petróleo proporcionado pelo Estado do Rio. O petróleo é produto, e
a Constituição autoriza os Estados a cobrar o imposto de circulação de mercadoria sobre os produtos fornecidos a outros Estados.
Todos os produtos, não. Uma breve alínea proíbe o recebimento do
imposto "sobre as operações que
destinem a outros Estados petróleo (...)".
Introdutor, na Constituinte, da
ressalva perversa que nega ao Estado do Rio muito mais bilhões
do que os dois citados: o então deputado José Serra. Como o Rio
poderia ser outro, não fosse a discriminação introduzida contra o
Estado, nele faz alguma justiça o
último lugar em que os eleitorados fluminense e carioca, mesmo
sem saber da tal alínea, mantêm
Serra.
A crença de que a sorte de José
Serra só será decidida no horário
eleitoral gratuito, com o trabalho
dos seus marqueteiros, não é recusável a priori. Nem o é, também, a dependência que a sorte
de um candidato tem do desempenho alheio, no caso, o de Ciro
Gomes. Mas os bispos e cardeais
da candidatura de José Serra que
ainda pensavam assim, até o último Ibope, deixaram de fazê-lo. E
perderam a cerimônia para dizê-lo.
Para trás
Sufocado pelo Festival FMI, com
que o governo e a mídia comemoraram os US$ 30 bilhões que vêm
inflar ainda mais a dívida brasileira, saiu o balanço do desempenho econômico do país no primeiro semestre. A produção industrial caiu 0,1% e as vendas da indústria caíram 1,84%, em comparação com a do primeiro semestre
de 2001.
Desastrosos embora, para um
país que precisa desesperadamente de crescimento econômico,
esses números são ilusórios. Não
se deve esquecer, embora o noticiário não quisesse lembrar, que
as duas quedas estão comparadas
com o semestre em que, no ano
passado, a indústria e o comércio
já estavam amputados pelo racionamento de energia elétrica.
As quedas reais são muito mais gritantes, mas adequadas a um
país que está andando para trás.
Esclarecimento
O endereço eletrônico registrado como "janiodefreitas" não é meu,
nem de pessoa a quem conheça.
Texto Anterior: MST questiona redução na proposta agrária Próximo Texto: Ceará: Projeto do governo Ciro terá de ser refeito Índice
|