São Paulo, domingo, 12 de janeiro de 2003

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GOVERNO LULA

Dirceu pede a equipe que fale menos e estude propostas antes de divulgá-las

Após gafes, governo decide impor "mordaça" ministerial

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Apesar do pouco tempo de governo, auxiliares do presidente Luiz Inácio Lula da Silva já mapeiam o que chamam de pontos falhos na formação do ministério: sobreposição de funções, com pastas atuando nas mesmas áreas, e ministros demonstrando pouca intimidade com seus assuntos.
Na avaliação dos auxiliares, as boas notícias na economia (queda do dólar e do risco Brasil) e o estilo popular de Lula (que abraça e tira fotos com fãs, além do jeito informal com os ministros) dividiram espaço na mídia com as trapalhadas oficiais e conseguiram transmitir a impressão geral de um bom início de governo.
A Folha apurou que o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, já pediu a alguns ministros que procurem falar menos e estudar bem uma proposta antes de divulgá-la. Ele deseja evitar novas trapalhadas. Julga que algumas aconteceram porque o PT está aprendendo a ser governo.
O chefe da Casa Civil teve de arbitrar até disputa por espaço físico na Esplanada dos Ministérios a fim de evitar atritos.
Um dos homens fortes do novo governo, o secretário de Comunicação de Governo, Luiz Gushiken, também andou advertindo colegas para que pensem antes de falar. Além de controlar a publicidade federal, Gushiken é amigo antigo de Lula. Com fama de zen, é um dos principais conselheiros presidenciais e um dos poucos com liberdade para criticar Lula e seu governo com dureza.
Os ministros "campeões" de gafes, na avaliação de assessores de Lula, foram Anderson Adauto (Transportes), que teria mostrado desconhecimento de sua pasta ao anunciar a suspensão de licitações no valor de R$ 5 bilhões quando a cifra não chegava a R$ 1 bilhão, e Roberto Amaral (Ciência e Tecnologia), que gerou desconforto internacional pela admissão depois negada de que o Brasil deveria dominar a tecnologia para bombas nucleares.
Em audiência, Adauto chegou a ouvir de Lula recomendação para ser mais cauteloso. O presidente tem dito aos seus ministros que eles serão cobrados por tudo o que disserem.
Outra idéia de Adauto já está sendo tecnicamente criticada no governo. Ele pediu ajuda do Exército para construção e recuperação de estradas.
No entanto, os militares têm poucas equipes, se for levada em conta a demanda da área. Na comparação com o equipamento das empreiteiras do setor, os militares possuem maquinário obsoleto e demorarão mais tempo para executar o mesmo serviço.
Grosso modo, dizem técnicos do Ministério dos Transportes, o serviço feito pelo Exército, no final das contas, poderá sair mais caro. Ou seja, do ponto de vista gerencial, seria um mau negócio para o governo.

Caças da FAB
O próprio Lula, porém, tomou uma decisão que depois se mostrou tecnicamente equivocada, a de suspender a compra de caças novos para a FAB (Força Área Brasileira).
O argumento principal de Lula e sua equipe é que não pegaria bem o governo ir às compras no primeiro ano de gestão, no qual a prioridade é o combate à fome. O governo disse ainda que usaria os US$ 700 milhões para a compra de caças no Fome Zero.
Detalhe: isso não pode ser feito. O consórcio internacional já tem financiador arranjado e os pagamentos do Brasil só começariam a ser feitos a partir de 2007. A Embraer, empresa que Lula disse na campanha que teria prioridade nas vendas ao governo, viu suas ações caírem.

Espaço físico
A principal prioridade social do governo, o Fome Zero, também tem tido dificuldade para sair do papel. Além do atraso na definição do seu formato final, o ministro do Combate à Fome e da Segurança Alimentar, José Graziano, teve de enfrentar a resistência da ministra da Assistência e da Promoção Social, Benedita da Silva, em dividir parte de seu espaço físico com ele.
Ela não queria abrir mão de um andar inteiro num dos prédios da Esplanada dos Ministérios.
Dirceu entrou em ação e deu a Graziano, no final da semana, o andar necessário para a equipe do projeto poder trabalhar.
Graziano ainda terá uma sala no Palácio do Planalto. Com menos de 20 cargos de confiança, deverá ter o número de funcionários da pasta ampliado na proporção do tamanho da tarefa.
A sobreposição de funções no caso de Graziano e Benedita foi proposital, segundo um ministro de Lula, devido à importância que o presidente Lula quer dar ao combate à fome.
Mas outros casos de sobreposição chamaram a atenção dos auxiliares de Lula, que teria exagerado na criação de tantos ministérios e secretarias (36 no total).
Exemplo: o secretário do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, Tarso Genro, fará reuniões com setores da sociedade. O secretário-geral da Presidência, Luiz Dulci, cuida da articulação política, função do cargo no governo passado. No entanto, o conciliador Dulci também se dedicará à relação entre governo e sociedade.
Genro também atuará na área do ministro da Previdência, Ricardo Berzoini, já que coordenará as discussões sobre a reforma da Previdência.
Esse é o primeiro passo do conselho, o embrião do chamado pacto social proposto por Lula durante a campanha.



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