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BALANÇO
Registro federal conseguiu reunir menos de 60% das famílias brasileiras que vivem hoje em extrema pobreza
Cadastro social de FHC deixa de fora 16 milhões de pobres
RANIER BRAGON
DA AGÊNCIA FOLHA
O governo Fernando Henrique
Cardoso chegou ao fim sem conseguir reunir no seu Cadastro
Único dos Programas Sociais
mais do que 60% das famílias brasileiras consideradas em extrema
pobreza, o que deixa de fora deste
registro federal mais de 16 milhões de miseráveis.
Iniciativa tomada em julho de
2001, o cadastro único já consumiu cerca de R$ 100 milhões em
sua execução e prevê a reunião,
em uma única lista, dos dados de
todas as 9,3 milhões de famílias
que vivem com menos de R$ 100
mensais por pessoa (estimativa
relativa ao ano de 1999).
O objetivo principal é garantir a
todas elas o acesso a pelo menos
um dos benefícios federais atualmente vigentes, como o Bolsa-Escola, o Auxílio-Gás e o Bolsa-Alimentação. O cadastro é uma referência fundamental para o governo de Luiz Inácio Lula da Silva,
que tem no social uma de suas
prioridades no início de governo.
A previsão era a de que o cadastro -que tem como intermediário as prefeituras, responsáveis
em identificar e providenciar a
inscrição das famílias- fosse finalizado em dezembro de 2001.
No final de 2002, porém, só 58%
das famílias pobres (5,4 milhões)
tinham os seus dados armazenados nos arquivos do governo.
Isso significa que cerca de 4 milhões de famílias em extrema pobreza, o que dá cerca de 16,3 milhões de pessoas, podem não estar
recebendo nenhum tipo de benefício do governo federal.
Há outros cadastros em vigor,
como o do Bolsa-Escola, mas o
governo não sabe se essa lista já
foi absorvida totalmente pelo cadastro único ou se há alguma separação, o que aumentaria o número de beneficiados. Ou seja, o
número de famílias pobres atendidas pela União pode ser maior,
mas só há a certeza do recebimento para 58% delas.
A Agência Folha ouviu nos últimos meses de governo, especialistas e representantes dos municípios sobre a questão e constatou
um fogo cruzado: de um lado, o
governo diz que grande parte do
atraso se deve ou à inoperância,
ou ao desinteresse, ou à falta de
estrutura das prefeituras para cadastrar suas famílias pobres.
Representantes dos municípios
rebatem com três argumentos básicos: a demanda seria muito
maior do que o número de benefícios oferecidos, haveria uma burocracia demasiada no processo
de inscrição e, por fim, toda a parte operacional caberia às prefeituras, sendo que muitas delas não
dispõem de recursos para a tarefa.
"O governo cria uma falsa expectativa de que todos vão receber, mas, quando há a restrição,
os que ficam de fora vão xingar é o
prefeito", afirma o presidente da
Confederação Nacional dos Municípios, o prefeito de Mariana Pimentel, no Rio Grande de Sul,
Paulo Ziulkoski (PMDB).
Ele afirma que os municípios,
que arcariam com toda a tarefa de
executar os programas federais,
nunca foram chamados para discutir as formas de financiamento
e operação dos programas.
"O Fome Zero [projeto do governo do PT que tem por objetivo
acabar com a fome no país", por
exemplo: fica o doutor fulano e o
doutor beltrano, todos personalidades, discutindo nos gabinetes,
mas pode ter certeza, quando entrar em funcionamento, vai cair
tudo nas costas dos prefeitos."
Ziulkoski diz ainda considerar
"chutômetro" a afirmação de que
60% das famílias pobres recebem
benefício federal. Segundo ele, esse número é menor. Em seu município, afirma, aproximadamente 90 famílias recebem o Bolsa-Escola, mas o número necessário de
benefícios seria de 150.
Avanço, com restrição
A coordenadora nacional da
Pastoral da Criança, Zilda Arns,
diz ver "enormes avanços" na
área social durante o governo de
Fernando Henrique Cardoso e
que os projetos, incluindo o cadastro, devem ser aperfeiçoados.
"Eles devem ter continuidade,
não dá para parar ou começar de
novo. Isso tudo custa muito dinheiro, esforço. Jogar fora desestimula todo mundo", afirma.
Arns ressalta que, pela experiência da Pastoral, também constata que há muita família sem auxílio federal, principalmente nas
cidades mais miseráveis do Brasil.
"A história do pobre é essa, é
sempre o miserável que recebe
menos, sou testemunha de que o
governo quer chegar lá, tem os recursos, mas falta capacitação, estrutura ou interesse das prefeituras", diz a coordenadora.
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