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PODER EM QUESTÃO
Casos voltam à estaca zero se STF julgar não caber ao órgão investigar
Investigações do Ministério Público podem ser anuladas
LILIAN CHRISTOFOLETTI
DA REPORTAGEM LOCAL
Algumas das investigações mais
rumorosas dos últimos anos no
Brasil poderão voltar à estaca zero
dependendo da decisão que o STF
(Supremo Tribunal Federal) vier
a tomar no processo que questiona os poderes de atuação do Ministério Público. Entre os casos
estão: TRT-SP, Santo André, Sudam, Banco Marka, Operação
Vampiro e Maluf/Jersey.
No processo sob análise do STF,
questiona-se o direito de o Ministério Público realizar ou participar de investigações criminais.
Procuradores e promotores teriam, segundo a argumentação
feita no processo, apenas a atribuição de requisitar investigações
à polícia, fiscalizá-las e encaminhar denúncias ao Judiciário.
Se o STF considerar, de fato, que
a Constituição impede o Ministério Público de tomar parte em investigações, existe a possibilidade
de todas as provas recolhidas até
agora pela instituição em suas
apurações serem consideradas
nulas ou ilegais, segundo opinião
unânime de seis especialistas consultados pela Folha.
"Ao se considerar que a investigação é nula, porque não foi feita
pela polícia, e uma pessoa foi presa, a primeira providência seria
soltá-la", disse o procurador-geral de Justiça do Estado de São
Paulo, Rodrigo Rebello Pinho.
Segundo Pinho, eventual decisão poderá afetar não apenas as
investigações em curso, mas também os casos que estão na Justiça
e os processos transitados em julgado (concluídos judicialmente).
"Antes era a lei da mordaça para
silenciar o Ministério Público.
Agora é a lei da algema para paralisar a atuação do órgão", afirmou, referindo-se ao projeto de
lei segundo o qual promotores e
procuradores não podem fazer
declarações sobre investigações
em andamento. O projeto não foi
votado no Congresso.
Para o advogado constitucionalista Ives Gandra Martins, se a
prova foi obtida por um órgão
sem atribuição para investigar, ela
é considerada viciada e precisa ser
revalidada pela polícia. Cláudio
Gracioto, juiz Tribunal do Júri e
diretor da Apamagis (Associação
Paulista de Magistrados), concorda com a tese. "Se o STF decidir isso, a prova passa a ser ilegal."
Compartilham o mesmo entendimento o presidente da seção
paulista da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Luiz Flávio
Borges D'Urso, a procuradora da
República Janice Ascari, e o professor de direito penal Manoel
Gonçalves Ferreira Filho.
Chuva de recursos
O STF está analisando um caso
específico, o do deputado federal
Remi Trinta (PL-MA), acusado
pelo Ministério Público de fraude
no SUS (Sistema Único de Saúde)
do Maranhão. Ele nega a acusação
e questiona se os procuradores
têm a atribuição de investigá-lo.
Uma eventual decisão do STF
favorável ao deputado cria jurisprudência e deverá provocar uma
enxurrada de recursos com a
mesma argumentação. "A previsão é que chovam habeas corpus
em todos os tribunais. Obviamente, os advogados de defesa vão citar essa decisão se for contrária à
investigação do Ministério Público e pedir o mesmo precedente
para os clientes deles", diz Ascari.
Se prevalecer o entendimento
de que o Ministério Público não
tem atribuição para investigar, as
provas obtidas pelo órgão deverão ser revalidadas pela polícia. Isso pode significar desde a simples
abertura de um inquérito burocrático até a repetição de cada
passo do processo.
O juiz aposentado Nicolau dos
Santos Neto, por exemplo, foi
condenado a oito anos de prisão
com base em provas reunidas pela Procuradoria de República de
São Paulo. Responsabilizado pelo
desvio de R$ 169,5 milhões do Fórum Trabalhista de São Paulo, o
juiz poderia ter sua pena anulada.
Em Santo André (SP), a Promotoria criminal acusou o empresário Sérgio Gomes da Silva de ser o
mandante da morte do prefeito
Celso Daniel (PT). A motivação
alegada do crime é um esquema
de propina na prefeitura. Gomes
da Silva nega as acusações. A conclusão da Promotoria contrariou
o inquérito policial, que concluiu
por crime comum.
Como as provas foram produzidas pelo Ministério Público, advogados do empresário pediram a
nulidade do caso ao TJ (Tribunal
de Justiça) de São Paulo e ao STJ
(Superior Tribunal de Justiça). O
entendimento dos dois órgãos foi
que, se a Promotoria pode pedir
investigações à polícia, também
pode executá-las.
Para tentar minimizar eventuais
confusões jurídicas, o STF poderá
estabelecer alguns limites. Dizer,
por exemplo, que a mudança não
tem caráter retroativo ou que não
se aplica a investigações do MP
que já teriam chegado à Justiça.
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