|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
FOLCLORE POLÍTICO/FERNANDO MORAIS
Brizola levou a faixa presidencial em 64
A faixa presidencial que Fernando Henrique Cardoso passará a seu sucessor em janeiro foi
usada, pela primeira vez, há quase 40 anos, por um homem que
não havia recebido um só voto
popular: o marechal Castello
Branco, eleito indiretamente pelo
Congresso Nacional.
Na manhã de 15 de abril de
abril de 1964 o cerimonial do Palácio do Planalto se alvoroçou:
faltavam poucas horas para o
presidente interino, o deputado
Ranieri Mazzilli, transmitir o cargo a Castello Branco, e não havia
meio de localizar o mais conhecido símbolo da Presidência. Ninguém sabia onde tinha ido parar
a faixa de gorgorão verde-amarelo, com as pontas unidas por um
brasão de armas da República.
Socorrido por um alfaiate especializado em fazer fardões para a
Academia Brasileira de Letras, na
hora da cerimônia Mazzilli pendurou no peito de Castello uma
faixa zero quilômetro.
Já fazia duas semanas que o
presidente João Goulart fora derrubado e os militares tinham o
controle absoluto do país. Todos
os líderes, ministros, governadores e altos funcionários do regime
deposto estavam presos ou no exílio, à exceção de um deles, talvez o
mais odiado pelos novos governantes. Ao contrário do que durante muitos anos se imaginou, o
ex-governador Leonel Brizola
ainda permaneceu clandestinamente no Brasil por cerca de um
mês e meio. Só em meados de
maio é que alguém foi buscá-lo,
certa noite, num dos sótãos e porões em que ele se escondera, em
Porto Alegre, para tirá-lo do país.
Fardado de oficial da PM e sem
largar jamais uma pequena valise negra, Brizola foi levado de
carro à praia de Cidreira, a cem
quilômetros da capital gaúcha,
onde embarcou em um teco-teco
com destino ao Uruguai. Ainda a
bordo do avião, ele abriu a pasta
e admirou o troféu que transportara com tanto zelo: a faixa presidencial estava ali, intacta e a salvo dos usurpadores do poder.
Não se sabe que destino Leonel
Brizola deu à peça protocolar: se
perdeu-a em algum exílio ou se a
guardou todo esse tempo com a
expectativa de um dia vir, ele próprio, a envergá-la. Se a faixa ainda existe, e a menos que o ex-governador tenha planos de disputar a Presidência em 2006 (quando terá 85 anos), talvez esta seja
uma boa hora para devolvê-la a
seu legítimo dono, o presidente
que for eleito no próximo dia 27.
PLÍNIO ARRUDA SAMPAIO, 72,
ex-deputado federal pelo PT e membro
da Assembléia Constituinte de 1988,
escreve às terças-feiras nesta seção
Texto Anterior: Serra vai tentar debater e mirar gestões petistas Próximo Texto: Pesquisa: Dos eleitores, 72% usaram cola para votar Índice
|