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JANIO DE FREITAS
Beneficiários do terror
O atentado em Madri assinalou exatos dois anos e meio
de fracasso absoluto da luta contra o terrorismo. Por diferentes
modos, ressaltou a mediocridade, em muitos casos acompanhada de leviandade, dos que têm dirigido nossos países ocidentais.
O fracasso tão completo se explica, em última instância, pelo
fato de que, entre o atentado de
11.9.2001 nos Estados Unidos e o
da Espanha em 11.3.2004, mais se
acirraram as motivações dos diferentes ímpetos terroristas, sem
que uma só delas fosse objeto de
atenção interessada. O que se
tem chamado de luta contra o
terrorismo é só uma sucessão
tresloucada de restrições a direitos e liberdades individuais, em
graus variados de violência pelo
mundo afora. Dos Estados Unidos à Tchetchênia, do Oriente
Médio à Indonésia, da Malásia à
África, seja onde for, todos estamos oprimidos por arbitrariedades indiscriminadas, mas a vulnerabilidade a ações da Al Qaeda, como de outros possíveis terrorismos internacionais, continua a mesma.
O antiterrorismo está dominado por propósitos políticos individuais ou partidários. Nenhum
dos dois com fundamentos respeitáveis. Desde a modalidade
que lhe deram os narodniks russos no final do século 19, o terrorismo pode ter o sentido, de outros, de propaganda. Mas quem
o imaginaria, mesmo nos nossos
tempos, subvertido em peça de
marketing político?
Com a exploração do antiterrorismo, Bush se deu uma dimensão que jamais esperaria
dentro do seu país, por falta incorrigível de mérito, quanto
mais fora de lá. O antiterrorismo
ao seu modo é, agora, a bandeira
da campanha pela reeleição. Na
Inglaterra, associar-se ao antiterrorismo belicista de Bush serviu a Tony Blair para encobrir o
colapso da sua Terceira Via, afinal reduzida a mera via auxiliar.
Por seu lado, os políticos do governo espanhol iniciaram a exploração eleitoral do atentado
quando ainda sangravam as vítimas nos lugares das explosões.
Confronto direto ou negociação
com o ETA basco é uma das divergências influentes na disputa
eleitoral de hoje na Espanha, entre a linha dura do PP governista
e o PS. Os pepistas não tiveram
pejo em relegar os indícios apontando para a ferocidade socialmente indiferente da Al Qaeda, nem, depois, em desprezar as declarações de autoria dos fundamentalistas e de isenção do terror basco, que jamais renegou
um de seus atos. No primeiro-ministro José María Aznar e em
seus correligionários prevaleceu,
sobre o crime, sobre os mortos e
sobre os feridos, a conveniência
eleitoral de lançar, contra os partidários de negociação com o
ETA, o eleitorado enraivecido.
Não lhes importou o habeas corpus preventivo que deram à Al
Qaeda.
As sociedades estão igualmente
expostas ao terrorismo e aos efeitos incivilizantes, e freqüentemente também criminosos, da
mediocridade e leviandade elevadas por métodos torpes a poder dominante. Em tal panorama, o cidadão comum pode no
máximo perguntar em vão: qual
será o próximo?
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