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NO PLANALTO
Sob Lula, PT troca o certo pelo conveniente
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Instalar a CPI do Banestado agora é inconveniente
para o governo. A PF informa
que a lista dos que mandaram
US$ 30 bilhões ilegalmente para
fora do país inclui, além de empresários, alguns políticos. A exposição dessa gente colocaria
em risco a votação das reformas.
Ir muito fundo na investigação dos grampos telefônicos da
Bahia é inconveniente para o
governo. Obrigaria o ACM a
dar explicações demais. E o grupo político dele ficaria tentado
a ir para a oposição. Justamente
na hora em que o Lula mais
precisa de votos no Congresso.
Desencavar o discurso de um
Lula de 1987 insinuando que o
Sarney é desonesto é inconveniente para o governo. Divulgar
o vídeo com som e imagem do
discurso é levar a inconveniência longe demais. Rabugice de
radical. Que ainda acalenta a
ilusão de que é possível ser governo sem perder a inocência.
Criticar a política de juros altos num momento como esses é
inconveniente para o governo.
Passatempo de vice desocupado. Cedendo à gritaria, o Palocci passaria recibo de fraco. O
dólar volátil daria no pé. O ministro só está sendo estratégico,
para não pôr tudo a perder. Ou
está perplexo como todos os
brasileiros. Na dúvida, faça como os banqueiros. Não critique.
Reclamar do superávit fiscal
de 4,25% do PIB é inconveniente para o governo. Artifício de
ministro sem criatividade. A
melhor maneira de mostrar que
Brasília não tem o menor escrúpulo em seguir o programa do
FMI é entregar mais do que o
solicitado.
Lembrar que, no palanque,
Lula prometeu criar 10 milhões
de novos empregos é inconveniente para o governo. Campanha política não é substância, é
teatro. O presidente já avisou
que o "espetáculo do desenvolvimento" virá ao seu tempo. Se
a cortina subir antes da hora, a
platéia pode flagrar uma cena
imprópria: a República de bruços, sendo assediada por peemedebês e petebês. Melhor esperar pela arrumação das coxias.
Noticiar a volúpia com que
José Dirceu se entrega à distribuição de cargos é inconveniente para o governo. Mania de
uma certa imprensa impatriótica, cética e irrecuperável. Não se
pode cobrar do chefe de cozinha
explicações para cada ovo sacrificado. A preocupação com a
integridade dos ovos deve considerar, de resto, a perspectiva de
proveito do omelete.
Deputado petista comparecer
a manifestação de servidores
públicos pode. Desde que não
faça coro contra a reforma da
Previdência. A idéia de que o
Lula não controla nem as facções do próprio partido é inconveniente para o governo. Não
custa defender hoje o que ontem era repudiado. Incoerência
não arranca pedaço de ninguém. Vaia muito menos.
O petismo no poder inaugura
uma fase auspiciosa na política
nacional. Não há mais certo e
errado. Instituiu-se um novo
padrão ético-moral. Agora só
há conveniente e inconveniente. Lula reedita FHC com uma
enorme vantagem: não tem um
PT na oposição para encher-lhe
o saco.
Um PT coerente, com disposição para cair de pau em cima
dos menores pecados, é extremamente inconveniente para
qualquer governo. Por sorte, no
Brasil nada se transforma. Tudo apenas envelhece.
Com o tempo, a cumplicidade
passa por amadurecimento. E a
virtude se integra à baixeza geral. Revogam-se todas as culpas. A anomalia assume ares de
hedionda normalidade.
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