|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
AGENDA NEGATIVA
Estudiosos afirmam que população brasileira não tem tradição de ação coletiva, apesar das frustrações
Intelectuais não vêem instabilidade no país
DO COLUNISTA DA FOLHA
O "abril vermelho" do MST
(Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra), a quase guerra
civil no Rio de Janeiro -corre o
governo Lula o risco de ser desestabilizado pelas ruas, como ocorreu em um punhado de países latino-americanos nos últimos 10
anos?
Não. É a resposta, desta vez unânime, dos estudiosos de Brasil/América Latina consultados pela
Folha. Scott Mainwaring (Universidade Notre Dame) até se anima a contestar a idéia de que a
América Latina esteja vivendo
uma instabilidade crônica, a partir da tese, bem defensável, de que
as mudanças havidas nos anos recentes foram de governos, mas
não de regimes. Ou, posto de outra forma, não se passou da democracia para a ditadura ou do
capitalismo para o comunismo.
Mainwaring usa o exemplo do
passado recente do próprio Brasil
para defender seu ponto de vista:
"O processo de impeachment de
Fernando Collor de Mello (1992)
foi um caso de instabilidade governamental, mas dentro da estabilidade do regime", declarou.
O pesquisador norte-americano
fica assim tranqüilo para dizer
que "não há virtualmente nenhum risco de que Lula possa
também ser afetado por instabilidade governamental".
Sem instabilidade
Outros especialistas apontam
pelo menos dois motivos para
descartar os riscos de instabilidade governamental no Brasil:
1 - "O Brasil tem baixa tradição
de ação coletiva nas ruas, ao contrário de, por exemplo, Argentina, Peru e Chile" (Thomas Skidmore).
"Apesar de o Brasil ter um grau
elevado de frustração social e de
decepção política, não acho que
seja um país de fortes convulsões
sociais, do tipo argentino ou andino" (Olivier Dabène).
"Os países andinos (nos quais a
instabilidade tem sido mais freqüente) são extraordinariamente
diferentes do Brasil. A população
indígena está se mobilizando agora após anos de repressão e de
marginalização. Esse tipo de ingrediente não existe no Brasil. A
comparação lógica seria com os
afro-brasileiros, mas os ingredientes para sua organização e
mobilização não existem no momento, para o bem ou para o mal"
(Riordan Roett).
2 - "O Brasil avançou muito desde os tempos de Fernando Collor,
e hoje é um país muito mais estável, com instituições políticas que,
embora longe de perfeitas, são
muito mais sólidas do que eram
havia 15 anos", afirma Francisco
Panizza, da LSE (London School
of Economics).
Avanço institucional
Esse avanço institucional é, para
Panizza, "o maior legado de Fernando Henrique Cardoso, e não
vejo perigo de que o governo Lula
seja afetado pela onda de instabilidade que atinge principalmente
os países do Pacífico andino".
Concorda Riordan Roett: "O
Brasil tem instituições deficientes,
mas existentes, que geralmente
funcionam. A corrupção continua sendo um problema, mas, de
modo geral, há uma disseminada
aceitação da estrutura governamental. No momento, o Brasil é
um sistema político estável".
Esse "no momento" não deixa
de introduzir um elemento inquietante em um cenário que os
especialistas consideram unanimemente positivo. A inquietação
é reforçada por uma pergunta de
Thomas Skidmore, que ele próprio evitou responder:
"Quão grande é a capacidade da
sociedade brasileira de absorver
crescimento baixo e queda da
renda?"
(CLÓVIS ROSSI)
Texto Anterior: Em nota, PPS vê "paralisia" do país e "ameaça de ruptura da ordem pública" Próximo Texto: "Primeiro ano foi um sucesso", diz diretor Índice
|