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NO PLANALTO
Ex-PT dá de ombros para descalabro da Previdência
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O computador veio ao
mundo para agilizar as
coisas. Operou milagres no Ministério da Previdência Social.
Ali, à medida que avança a informática, cometem-se fraudes
cada vez maiores em intervalos
de tempo cada vez menores.
Só em benefícios ativos, o
banco de dados eletrônico da
Previdência guarda 21 milhões
de registros. O colosso foi varejado nos últimos meses por
duas auditorias do Tribunal de
Contas da União.
A primeira, concluída em 10
de dezembro de 2003, foi esmiuçada aqui há quatro meses.
A segunda saiu do forno no último dia 23 de junho. Remeteram-se cópias dos relatórios
para José Dirceu.
O chefão da Casa Civil não
leu os escritos dos auditores. Tinha mais o que fazer. Assoberbava-o a preparação do discurso à Fidel -uma hora e 20 minutos- que faria na festa de
um ano e meio de petismo. Pena ter-lhe faltado tempo. Privou-se de constatar que ainda
não sopram na Previdência os
bons ventos de que falou no
pronunciamento.
Os arquivos plantados nos
supercomputadores da Previdência têm a confiabilidade de
um aparelho eletroeletrônico
paraguaio. Continuam armazenando descalabros.
Contam-se aos milhares os
mortos que recebem aposentadoria. Há também vivos, vivíssimos, beliscando mais de um
benefício simultaneamente.
Há filhos e mães mordendo
pensões de pais e maridos cujos
nomes a Previdência desconhece.
Há procuradores sacando
aposentadorias na rede bancária com cartões magnéticos de
titulares que já foram à cova.
Há aposentadorias escoradas
em certidões de nascimento
inidôneas e em atestados médicos falsos. Há detentores de benefícios com nomes exóticos.
Um deles se chama
"*************". Outro atende
pela alcunha de "02092001".
Há o diabo.
Na última sexta-feira, José
Dirceu discutiu com quatro colegas de ministério uma forma
de pagar aposentadorias atrasadas que os velhinhos foram
buscar na Justiça. Coisa de R$
12,3 bilhões. Decidiu aumentar
a contribuição previdenciária
paga pelas empresas. Não se
ouviu palavra sobre a conveniência de lacrar sumidouro
das fraudes. Beleza.
Operam hoje na Previdência
18 forças-tarefa. Quase todas
começaram a trabalhar na era
tucana. Juntas, compõem a
maior usina de investigação de
fraudes em ação na gestão pública. Para cada malfeitoria
detectada e anulada, outras
tantas são inseridas nos computadores. Os investigadores
enxugam gelo.
Reconheça-se, porque é de
justiça, que o petismo não é responsável pelo flagelo. Mas anote-se, em homenagem à verdade, que a inação do ex-PT o
torna sócio benemérito da desordem. Quantas vezes o leitor
não ouviu falar de fraudes na
Previdência? Tantas que o assunto talvez já nem lhe prenda
a atenção. Pois passa despercebido também ao governo. O tema se perde em meio às banalidades do cotidiano.
Ainda recentemente Lula
deu eloqüente demonstração
do apreço que devota à causa.
Tolerante com os maus costumes, levou o Ministério da Previdência à bacia das almas dos
negócios políticos. Adaptado à
tradição das alianças esdrúxulas, entregou a pasta ao PMDB.
Hoje como ontem, a politicagem prevalece sobre racionalidade. Um decreto de 1999 (número 3.000) tornou obrigatória
a apresentação do CPF para a
concessão de qualquer benefício da Previdência. A despeito
disso, o INSS não promove a
checagem das informações levadas aos seus arquivos eletrônico com os dados do cadastro
de pessoas físicas da Receita
Federal.
Pior: na inspeção do TCU,
feita por amostragem, descobriu-se a existência de 1,6 milhão de fichas da Previdência
que não contém o número de
CPF do beneficiário da aposentadoria. Detectaram-se também 3 milhões de fichas que
não anotam nem o nome do favorecido nem o de sua mãe.
Um acinte.
Ouvido pelo repórter, o ministro Amir Lando (PMDB-RO) evita fugir do óbvio: "Nosso cadastro realmente está superado. É arcaico. Pessoas entram no sistema para criar benefícios fictícios. Também emitem certificados de liquidação
de dívidas previdenciárias que
permanecem em aberto".
Lando se diz disposto a agir.
"É preciso dar o primeiro passo
para corrigir tudo isso. É hora
de mudar. Vamos cruzar os
nossos dados com o cadastro de
CPFs da Receita."
Antes de começar a conversar
com os arquivos do fisco, os
computadores da Previdência
terão de falar consigo mesmos.
Hoje, as máquinas do Sisobi
(Sistema de Óbitos da Previdência) não dialogam com as
do Sisbin (Sistema de Benefícios). Por isso há tantos mortos
recebendo aposentadoria.
As malfeitorias pescadas pelo
TCU atingem de 25% a 35% de
todo o cadastro de "mortos" da
Previdência. Só nesse universo,
os auditores projetam um prejuízo potencial de R$ 16,3 milhões por ano.
Decidiu-se promover nova
fiscalização. Será mais profunda que as duas primeiras. Torce-se para que o camarada Dirceu, gerente-geral do condomínio, encontre um naco de tempo para desperdiçar com o assunto.
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