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DIPLOMACIA INADIMPLENTE
Membros do Itamaraty que servem na Europa estão sem receber auxílio-moradia há 5 meses
Diplomatas vivem de empréstimos do BB
MARIA LUIZA ABBOTT
DE LONDRES
Há cinco meses sem receber o
auxílio-moradia, os diplomatas
brasileiros nas principais capitais
européias estão vivendo na penúria. Em cidades mais caras, como
Londres e Paris, o aluguel chega a
representar até 70% do salário, e
muitos estão sobrevivendo a custa de empréstimos no Banco do
Brasil, pois contavam com o benefício para conseguir equilibrar
o orçamento doméstico.
No entanto as despesas estão se
acumulando e muitos estão tendo
dificuldades em fazer o pagamento, inclusive do empréstimo. Em
Paris, um diplomata brasileiro já
perdeu o cartão de crédito e o talão de cheques por causa dos atrasos, e está sendo obrigado a sacar
todo o salário e a pagar as contas
em dinheiro.
Não é a primeira vez que a contenção de gastos públicos provoca
um aperto geral nas representações brasileiras no exterior, especialmente porque os gastos são
em dólar e os limites do orçamento são em reais, sofrendo com
qualquer desvalorização da moeda brasileira.
O atraso no pagamento de salários e do auxílio-moradia não é
incomum, e aconteceu em governos anteriores, como os dos ex-presidentes Fernando Henrique
Cardoso e Fernando Collor.
Desta vez, as representações
brasileiras chegaram a atrasar em
um mês o pagamento de salários
dos funcionários locais contratados, que estavam ameaçando paralisação.
A divulgação da notícia no Brasil levou à liberação dos recursos
no dia seguinte, 10 de outubro, e a
situação se normalizou.
Proibições
Mas em algumas embaixadas
ainda estão proibidas as horas extras para funcionários para conter
gastos. Em Roma, por exemplo,
os motoristas estão cumprindo
exclusivamente o horário normal,
sem exceções nem mesmo para
buscar autoridades no aeroporto.
As viagens a serviço dos diplomatas na Europa estão sendo feitas
sem adiantamento de despesas e,
com a contenção de gastos, o
reembolso está atrasado. Os juros
no cartão de crédito estão sendo
pagos pelos diplomatas.
O salário de um ministro conselheiro de uma embaixada, o posto
imediatamente abaixo de embaixador, em Paris, Roma, Londres,
Lisboa e Madri está em US$ 11
mil, o que parece muito para
quem gasta em reais, mas não
permite luxos quando os gastos
são em libras ou euros. Obrigados
a representar o país em ocasiões
oficiais, diplomatas não recebem
verbas de representação, mas é
parte da função que eles e seus
cônjuges se vistam bem e recebam em casa.
Filhos
Segundo um diplomata que serve em uma capital européia, um
casal com dois filhos precisa morar em um apartamento de três
quartos, pois é obrigado a convidar pessoas a sua casa. O aluguel
custa 4.300, que chegam a US$
5.500, incluindo luz e telefone.
A esses gastos soma-se a prestação do carro que os diplomatas
têm que comprar em cada posto,
pois não é permitido levar o automóvel quando são transferidos, e
o seguro, alto, porque eles não
têm residência permanente. No
total, só essas despesas chegam a
outros US$ 2.000, e quase 70% do
salário já foram gastos. Por isso, o
auxílio-moradia -que paga uma
parte do aluguel e varia de acordo
com o custo de vida em cada cidade- é essencial no orçamento de
um diplomata.
Já um segundo secretário ganha
US$ 6.000, mas, como as responsabilidades do cargo são menores
e a representação também, os custos de aluguel representam a metade do salário em uma cidade como Roma, Madri e Paris.
Mas, segundo um diplomata
que serve na zona do euro, já está
difícil pagar a conta de telefone ou
a escola das crianças. Como mora
em uma cidade onde não se fala
inglês ou francês, os filhos têm
que estudar na escola americana
ou na francesa, que são pagas.
De outra maneira, como vão
conseguir estudar se forem transferidos para Tóquio?, indaga um
diplomata, observando que, em
países como o Japão, as únicas escolas estrangeiras são em francês
ou inglês.
Euro forte
A legislação proíbe que os cônjuges dos diplomatas trabalhem, e
a família toda vive de um salário
quando está no exterior. Outra dificuldade para os que trabalham
na zona do euro é a valorização da
moeda em relação ao dólar, como
são pagos os diplomatas no exterior. Há dois anos e meio, 1 valia
US$ 0,80. Hoje, vale US$ 1,20.
O embaixador do Brasil no Reino Unido, José Maurício Bustani,
reconhece que a falta de recursos
é um problema sério. "Enfrentamos uma situação financeira extremamente difícil no Itamaraty,
algo que já ocorreu diversas vezes
no passado. Mas estou tranquilo,
porque sei do empenho total do
ministro Celso Amorim em resolver a questão o mais rapidamente
possível junto às autoridades
competentes", disse Bustani.
A folha de pagamentos da embaixada brasileira em Londres
tem 14 diplomatas, oito oficiais de
chancelaria e dois assistentes de
chancelaria, além de 40 funcionários locais, incluindo os funcionários da residência oficial. Na de
Paris, são 85 funcionários, incluindo os contratados locais.
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