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CIDADÃ REVISTA
Parágrafo suprimido relacionava-se às reuniões do Congresso; dois novos casos de artigos sem aprovação são descobertos
Texto aprovado não entrou na Constituição
RANIER BRAGON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Depois da revelação de que artigos da Constituição de 1988 não
foram votados em nenhum dos
dois turnos previstos, novo levantamento da Folha traz à tona dois
artigos que não passaram, em
parte, pelo crivo do voto e mostra
que houve o oposto: um parágrafo que, apesar de ter sido aprovado nos dois turnos, não entrou no
texto promulgado -foi suprimido entre a votação e a publicação.
O parágrafo aprovado era para
constar do artigo 57, que trata das
reuniões do Congresso. Ele previa
que o regimento da Câmara e do
Senado regularia o funcionamento das duas Casas nos 60 dias anteriores às eleições.
A Comissão de Redação do
Congresso Constituinte, incumbida apenas de corrigir e aprimorar a redação das propostas aprovadas nos dois turnos, foi a responsável pela supressão, assim
como por alterações e inclusões
não decididas no plenário.
"Senhor presidente, como é que
poderemos suprimir um parágrafo que foi aprovado em dois turnos de votação", disse o então
constituinte e futuro presidente
da República, Fernando Henrique Cardoso, na reunião da comissão que decidiu pela retirada
do parágrafo -ocorrida no dia 14
de setembro de 1988, 21 dias antes
da promulgação da Carta.
"Não se preocupem, porque a
Câmara dos Deputados toda estará de acordo e o Senado também", respondeu o presidente da
constituinte, Ulysses Guimarães
(1916-1992). O temor dos membros da comissão era o de que o
parágrafo inviabilizasse a regulamentação futura, pelos regimentos, do chamado recesso branco,
que normalmente ocorre no Congresso antes das eleições.
Isso porque existia no texto a
expressão "eleições gerais", o que
poderia gerar a interpretação de
que só caberia manifestação do
regimento em eleições gerais, e
não em isoladas, como a de prefeitos ou presidente, por exemplo.
"O Senado não [está de acordo].
O Senado quer trabalhar", respondeu FHC a Ulysses.
O parágrafo aprovado e que não
entrou na Carta é o seguinte: "O
regimento disporá sobre o funcionamento do Congresso nos 60
dias anteriores às eleições gerais".
Ele era o 3º do artigo 57.
Discussão
A discussão sobre o assunto foi
levantada pelo constituinte Ricardo Fiuza, que queria, na verdade,
substituir a expressão "eleições
gerais" por "eleições parlamentares". Hoje, o recesso branco é previsto no regimento do Senado,
que diz que a Casa funcionará,
nos 60 dias anteriores às eleições,
de "acordo com o disposto do Regimento Comum".
No Regimento Comum, as sessões só são convocadas quando
há matéria a ser votada. No Regimento da Câmara, não há menção ao recesso branco, apesar de
ele ser usado na prática.
Além do artigo aprovado e não
incluído, o novo levantamento da
Folha -realizado em documentos oficiais da Câmara- mostra
que pelo menos oito artigos entraram na Carta sem terem sido
votados nos dois turnos devidos.
No primeiro levantamento, publicado no dia 9 deste mês, houve
a constatação de cinco artigos
sem votação, além de pelo menos
outros 20 que só foram aprovados
em um turno.
A revisão da história constituinte surgiu a partir de declarações
feitas pelo hoje ministro do Supremo Tribunal Federal Nelson
Jobim, então constituinte pelo
PMDB, ao jornal "O Globo".
Revelação
Jobim revelou a não-votação de
um artigo -a inclusão da expressão "independentes e harmônicos
entre si" no artigo 2º, que trata
dos Poderes da União- e a existência de outro, sigiloso.
O ex-deputado Jarbas Passarinho revelou depois a existência de
outro caso, que foi a explicitação
da garantia de direitos como 13º e
férias aos militares -artigo 42.
Os dois novos casos detectados
pela Folha são relativos aos artigos 4º e 55. No 4º, estendeu-se a
toda a população a gratuidade relativa aos "atos necessários ao
exercício da cidadania", como a
emissão de título de eleitor. O texto aprovado previa isso só para os
"reconhecidamente pobres".
No artigo 55, deu-se uma sobrevida a parlamentares ameaçados
de perder o mandato em decorrência de condenação criminal.
Trocaram a expressão "sentença
definitiva irrecorrível" por "transitada em julgado" como uma das
condições para a perda. Sentença
irrecorrível pode ainda não ter
transitado em julgado.
"É melhor. Dá mais 15 dias",
disse, na reunião, o deputado Michel Temer, hoje presidente nacional do PMDB.
Os outros quatro artigos detectados pelo primeiro levantamento da Folha são o que inclui a idade mínima de 21 anos para ser juiz
de paz (artigo 14), o que aumenta
de 33 para 42 o número mínimo
de vereadores nas cidades com
mais de 5 milhões de habitantes
(artigo 29), o que inclui as medidas provisórias como parte do
processo de legislar (artigo 59) e o
que manteve a competência dos
tribunais estaduais (artigo 70 das
Disposições Transitórias).
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