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MÁQUINA ELEITORAL
Coordenadora do programa do governador Zeca do PT, que distribui comida, diz a carentes: "É o Lula, gente"
Petistas usam cesta básica a favor de Lula
RUBENS VALENTE
ENVIADO ESPECIAL A CAMPO GRANDE
FABIANO MAISONNAVE
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CAMPO GRANDE
Coordenadores do programa de
distribuição de cestas básicas do
governador de Mato Grosso do
Sul, José Orcírio, o Zeca do PT,
têm feito reuniões com moradores pobres nos bairros de Campo
Grande para pedir votos a Luiz
Inácio Lula da Silva e Zeca, candidato à reeleição. O programa distribui 60 mil cestas por mês.
Houve pelo menos 14 reuniões
em dois dias da semana passada.
Sem que fosse pedida identificação à reportagem, a Folha acompanhou uma dessas reuniões na
última quarta. A platéia é formada por cerca de 60 mulheres, muitas delas com crianças no colo, e
quatro homens. Todos ouvem a
palestra com atenção e alguns
apertam na mão títulos de eleitor
e carteiras de identidade.
No centro da roda, no quintal de
uma casa de três cômodos na periferia de Campo Grande, a psicóloga Isabel Fernandes Alvarenga,
47, discursa: "Dia da eleição, é 13.
É fácil, não é mais complicado.
Aperta o [botão" verdinho, põe 13
de novo, aperta o verdinho. Só.
Ninguém vai saber em quem vocês votaram".
A palestrante não é uma simples
militante do PT. Coordena em
Campo Grande o Programa de
Segurança Alimentar do governo,
que distribui mensalmente 60 mil
cestas básicas.
O grupo começou a chegar às
13h. Durante toda a manhã, pessoas passaram em casas do bairro
Monte Castelo para chamar moradores "para fazer o cadastro e
ter direito a uma cesta básica".
Silva
Na reunião, Isabel se identifica
como coordenadora do Programa de Segurança Alimentar e pede votos para Zeca do PT e para
Lula: "Quem tem trânsito na sociedade, seja do mais simples
sem-terra ao maior? É o Lula, gente. É uma pessoa que tem trânsito,
que tem respeito. Então, a gente
não tem que ter medo. É da Silva,
sim. É Luiz Inácio Lula da Silva.
Igual muita gente que é Silva".
Uma senhora concorda: "Eu
também sou Silva". Encorajada, a
oradora segue em frente: "É nossa
hora, nós temos chance, como o
Lula tem chance".
Na parede da casa, um adesivo
do PT. A proprietária, Yolanda recebe os convidados vestindo uma
camiseta com propaganda de Zeca e do seu sobrinho Vander Loubet, deputado federal eleito.
Na hora marcada, o portão está
aberto e as pessoas vão entrando.
A maioria fica em pé. Às 13h30 começa a falar uma mulher que se
apresenta como assistente social
do governo. Ela enaltece o governador, explica que ele atende 60
mil famílias com cestas básicas e
leite e diz que ele "precisa continuar" esse trabalho.
Perto da oradora, uma senhora
de uns 80 anos de idade começa a
chorar e balbucia: "Eu moro em
Jaraguari [a 70 km de Campo
Grande" e não recebo essa cesta
básica. Eu preciso muito".
A assistente social diz que aquele caso "vai ser resolvido".
Uma outra senhora pergunta o
que deve fazer para receber a cesta
de alimentos, dúvida que parece
comum a todos. A assistente social explica que "a coordenadora"
chegaria logo para explicar como
seria "o cadastramento".
No fundo da platéia, uma mulher vira-se para outra e comenta:
"Eles vão cadastrar a gente e depois entregar a cesta em casa".
Após o primeiro discurso da
tarde, todos ficam à espera da
"coordenadora". Passa-se uma
hora. A impontualidade causa algumas defecções. Algumas senhoras vão embora com suas
sombrinhas e carrinhos de bebê.
Uma tenta convencer a amiga a ficar: "Eles vão cadastrar a gente".
A outra responde: "Eu não falei
que era só política?".
"Compração de voto"
Uma garota de 18 anos, com o título de eleitor na mão, atravessa a
conversa: "Será que eles não vão
entregar o sacolão?". A mulher
explica: "Não, só vão cadastrar e
depois dar. Senão fica que nem
"compração" [sic" de voto".
Dois homens com broches do
PT circulam com celulares na
mão, ansiosos. Isabel chega, para
alívio geral, por volta das 15h. Põe
a bolsa numa cadeira e logo se forma um círculo ao seu redor. Desculpa-se pelo atraso, dizendo que
estava em outra reunião.
Mais tarde, procurada pela Folha, ela contou ter feito seis reuniões do gênero naquele dia e disse que faria oito no dia seguinte,
quinta-feira. A agenda está lotada
no segundo turno.
Isabel também enaltece o governador petista. "Porque o nosso
governo, o do Zeca, o futuro governo do Lula, é um governo que
pensa na pessoa. Exemplo: quando a gente fala de Bolsa-Escola, o
governo Fernando Henrique
também tem Bolsa-Escola. Só que
a dele quanto vale?", pergunta à
platéia, que responde, em coro:
"Quinze reais!".
Isabel continua: "E a nossa,
quanto vale?". E as mulheres:
"Cento e trinta seis!". Então argumenta: "Nosso Estado é pequeno.
Imagina se o nosso Estado teria
condições, se não fosse a seriedade do governador Zeca, de estar
dando R$ 136 para 20 mil famílias.
Só tem se for governo sério".
A psicóloga fala por 20 minutos,
pede votos, mas diz que "não está
forçando ninguém" a votar no
PT. Mas ressalva: "Só que a gente
sabe. Se não for o nosso governo,
não fica assim". E continua: "Meu
pedido é esse, não é obrigar ninguém, não é pressionar ninguém,
não. É um pedido que a gente faz.
Nós precisamos continuar com
nossos projetos sociais".
Triagem
Uma mulher se aproxima e pergunta o que deve fazer para receber uma cesta básica. Isabel explica que o governo quer ampliar o
número de cestas para 100 mil.
Afirma que o governo não está
distribuindo cestas no período
eleitoral - só "em casos emergenciais"-, mas orienta os interessados a dar nome e endereço
para a técnica do programa que
está na reunião, Aparecida, para
uma triagem posterior, que dirá
se o caso é grave ou não.
O grupo se anima quando a técnica se senta num banquinho e
começa a anotar os primeiros nomes e endereços. Rapidamente se
forma uma fila de 32 pessoas. Cida faz as anotações numa agenda.
Está na hora de Isabel ir embora. Ela acena para Aparecida: "Cida, estou indo para o (bairro)
Campo Belo". E Cida responde:
"Boa viagem. Daqui a pouco vou
para o Talismã".
O repórter pede um telefone de
contato de Cida. Ela entrega um
papel com o seu celular anotado.
Do outro lado, vem uma mensagem escrita a lápis, assinada por
uma moradora da rua Doutor
Meireles, a duas quadras dali.
A súplica revela o que ela, afinal,
esperava daquela reunião: "Tenho dois netos para criar e necessito deste sacolão para ajudar na
alimentação da família".
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