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SOMBRA NO PLANALTO/ANÁLISE
Enfraquecimento de ministro -estrategista e um dos responsáveis pela chegada do partido ao poder- deixaria governo refém de aliados
Desgaste de Dirceu favorece liberais do PT
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Independentemente do afastamento ou não do cargo, o enfraquecimento político do ministro
José Dirceu (Casa Civil) assusta
dirigentes petistas de peso. Reservadamente, eles prevêem o enfraquecimento do PT na correlação
de forças dentro do governo e nas
alianças com os partidos aliados
no Congresso e nas eleições.
A primeira conseqüência é o
fortalecimento da chamada "direita" do governo. Leia-se: a equipe econômica, especialmente dois
auxiliares do ministro Antonio
Palocci Filho. Esses auxiliares são
o secretário do Tesouro, Joaquim
Levy, e o secretário especial de Política Econômica, Marcos Lisboa.
Os dois são vistos no PT e em setores do próprio governo como
conservadores que fazem a cabeça de Palocci.
Já Dirceu era tido pelos setores
moderados e radicais do PT como
o nome do governo que buscava
preservar as bandeiras do partido
na economia e na política.
Estrategista
Reconhece-se que foi o estrategista que fechou alianças fundamentais para a chegada da legenda ao poder central. Antes do caso
Waldomiro Diniz, a esperança
dessas alas do PT era que Dirceu
liderasse com vigor o movimento
para levar o governo mais para a
"esquerda" após um ano de forte
rigor fiscal e monetário.
Com Dirceu e Palocci nos postos-chave, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva montou um sistema de freios e contrapesos para
definir as diretrizes do governo. O
enfraquecimento de Dirceu desequilibra esse mecanismo.
É óbvio que o enfraquecimento
de Dirceu e do governo por conseqüência é também ruim para
Palocci, mas a área econômica
tem mais espaço para receber
blindagem do presidente contra
eventuais pressões dos aliados.
Deve ser levado em conta também que vieram do PT as maiores
críticas à política econômica do
ministro da Fazenda.
Dívidas
A segunda conseqüência é que o
partido e o governo ficarão devendo muitas obrigações aos aliados a fim de abafar a crise política
desencadeada pelo caso Waldomiro. Os aliados cobrarão mais
cargos federais nos Estados e em
Brasília, além de mais concessões
dos candidatos do PT nas eleições
municipais de outubro.
Homem da confiança de Dirceu, Waldomiro aparece em vídeo gravado em 2002 pedindo
propina e contribuição de campanha a um empresário do ramo do
bingo (Carlinhos Cachoeira). Na
época, Waldomiro presidia a Loterj (Loteria do Estado do Rio), no
governo Benedita da Silva (PT).
Em 2003, já na Subchefia de Assuntos Parlamentares da Casa Civil, Waldomiro se reuniu com Cachoeira e representantes de empresa interessada em renovar
contrato com o governo federal.
Pela trajetória do presidente
Luiz Inácio Lula da Silva e o discurso histórico do PT, que sempre
empunhou a bandeira da ética na
política como diferencial em relação aos outros partidos, será mais
oneroso enterrar uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito)
no Congresso do que nos governos passados.
Exemplo: o PMDB, que recebeu
do governo comunicado de que
seria apressada a entrega de cargos prometidos na reforma ministerial, fez jogada inteligente.
Disse que a pressa não se justificava porque a legenda, uma confederação de caciques regionais que
não sobrevive fora do poder, deseja evitar a imagem de agremiação fisiológica e chantagista. Na
prática, o PMDB vai esperar o fim
da tempestade para cobrar mais
caro na bonança.
Incomoda o PT a dependência
do governo em relação a dois nomes que o partido combateu historicamente: os senadores José
Sarney (PMDB-AP), presidente
do Congresso, e Antonio Carlos
Magalhães (BA), líder da banda
governista do PFL. Deputados do
PT, por exemplo, sentiram-se
constrangidos ao ver ACM na linha de frente da defesa de Dirceu.
O futuro de Dirceu
Especificamente sobre Dirceu, a
avaliação da cúpula do PT é que
ele jamais voltará a ser tão poderoso como era. Alguns caciques
chegam a dizer que ele pode até se
recuperar para desempenhar o
papel de gerente do governo, mas
emendam uma observação ferina: dificilmente concorrerá a cargos majoritários.
Traduzindo: está fora da disputa pelo governo paulista em 2006 e
provavelmente não será lembrado para disputar a Presidência pelo partido.
Julga-se que ele terá o emblema
do caso Waldomiro, pagando o
preço de ter levado um acusado
de corrupção para a vital posição
de negociador do governo com o
Congresso.
Cenários da crise
Assim como o governo, o PT
conta com o efeito do recesso prolongado de Carnaval e das medidas duras contra os bingos para
minimizar o desgaste com o caso
Waldomiro. Nesse tempo, será
avaliada a conveniência de Dirceu
se afastar temporariamente do
cargo -a solução Henrique Hargreaves, ministro do governo Itamar Franco que deixou o posto e
retornou depois de esclarecer formalmente as acusações que pesavam contra ele.
Manter Dirceu é a hipótese com
mais adesão hoje na cúpula do PT
e do governo, apesar de no cenário de extrema gravidade Lula
aventar substitutos. Ainda não há
decisão de Lula e outros nomes
podem surgir, mas, no caso de
substituição temporária, pensa-se
em Palocci, operação complicada
por afetar a área econômica, e
Luiz Gushiken (Comunicação de
Governo e Gestão Estratégica).
Em nota, a Secretaria de Comunicação da Presidência negou que
Gushiken seja cogitado para substituir Dirceu. Palocci classificou o
assunto como "boatos".
O afastamento, porém, poderia
assustar a oposição e resultar numa trégua política. Dirceu faria
um sacrifício, ganhando créditos
no governo e no PT. Voltaria ao
cargo caso nada de concreto seja
apontado contra ele ao fim de rápida investigação da PF (Polícia
Federal) ou de eventual CPI.
O pior cenário para o governo
seriam novas revelações sobre
Waldomiro e ramificações entre
petistas e os bingos.
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