|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
NO PLANALTO
Deixem o grampo em paz
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Os principais tipos de
idéias são as ruins e as
muito piores. Certas idéias, porém, nascem com cara de originais. Adotadas por pessoas
influentes, assumem ares de
sabedoria. Comportam-se como se tivessem tudo para ir
muito longe. Olhando-as de
perto, percebe-se que são medíocres como tantas outras.
O Bahiagate, por exemplo,
gerou a idéia de que Brasília
precisa produzir portarias, decretos e leis que inibam a proliferação do grampo telefônico.
A tese foi adotada em gabinetes de prestígio. Inclusive na
sala de José Dirceu, o chefão
da Casa Civil.
Ganha uma fita com a voz
de Geddel Vieira Lima quem
souber explicar como o endurecimento da legislação irá resultar no fim do grampo maroto, feito à margem da lei. Há
muito não se ouvia besteira
desse porte.
O brasileiro já conhece vários tipos de petistas. Há os incoerentes, os moderados e os
radicais. Mas petista bobo é
coisa que ainda não apareceu
nos jornais. Não é, portanto,
por lerdeza que o governo
apresenta uma tolice como algo revolucionário.
Para entender o que se passa, é preciso notar o seguinte:
nos últimos anos, a maioria
das investigações bem-sucedidas de casos de corrupção valeram-se do grampo.
Novas leis anti-escuta servirão à causa da sombra. O Ministério Público e a Polícia Federal vão perder uma de suas
principais ferramentas de trabalho.
Na oposição, o PT salivava
diante de um bom grampo.
Legal ou ilegal, tanto fazia. Sapateou sobre a escuta do Sivam. Sambou sobre as do
BNDES.
No poder, o petismo quer
acabar com o baile. Pode interromper a festa, desde que
do jeito certo, esmagando a
delinquência que, entra governo, sai governo, rói o erário.
A pregação anti-grampo
chega num instante em que o
mecanismo começa a forçar a
porta de uma das últimas cidadelas do breu: o Poder Judiciário.
O Congresso sujeita-se a vigilância implacável. O Executivo não fica muito atrás. O Judiciário, fechado e corporativo, parecia acima do bem e do
mal. Não está.
Graças aos grampos, começa-se a enxergar um problema
até bem pouco invisível: a infiltração do crime nos tribunais. O caso estampado hoje
nas páginas da Folha é eloquente.
O novo grampo é pródigo em
conversas esquisitas. Quem lê
as transcrições fica sabendo
que um jovem advogado de
Brasília, 28 anos, diplomado a
um ano, com currículo de estagiário de direito, atrai clientes
dispostos a entregar-lhe somas
milionárias. Sua credencial
mais vistosa é a condição de filho de juiz.
É certo que, sozinhas, referências comprometedoras a
magistrados e a seus parentes
não constituem prova de delinquência. Mas são um indício. Algo que, não investigado,
pode envenenar o resto da corporação.
Com tantas propostas por
aprovar no Congresso, o governo deveria sair de fininho
desse debate sobre o "aprimoramento" da lei do grampo.
Ele não serve a ninguém.
Vai aqui uma sugestão: malparado, o Bahiagate poderia
ganhar novos rumos se a Polícia Federal recorresse ao bom
e velho grampo. Pode ser a
única forma de arranjar um
escalpo à altura do escândalo.
Texto Anterior: Caso CC-5: Apelidos ocultam milhões de dólares em contas secretas Próximo Texto: Entrevista: Mendonça prega estatização do setor elétrico Índice
|