|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Coesão de novo bloco é questionada
DO COLUNISTA DA FOLHA
No fundo, o projeto brasileiro
de integração sul-americana é o
relançamento de uma idéia que o
chanceler Celso Amorim apresentou na sua primeira passagem
pela Chancelaria, durante o governo Itamar Franco: criar a Alcsa
(Área de Livre Comércio Sul-Americana), como uma espécie
de contraponto à Alca (Área de
Livre Comércio das Américas,
que englobará os 34 países americanos, menos Cuba).
É verdade que, agora, o governo
nega qualquer contraposição. Por
muito que defenda a integração
no Sul, o senador Aloizio Mercadante (PT-SP), por exemplo, jura
que, "em nenhum momento, o
governo está deixando de lado os
demais países".
Mas é indisfarçável a sensação
de que tentativa de criar um pólo
sul-americano ou é um contraponto à Alca ou, no mínimo, uma
forma de tornar mais forte a voz
do Sul na negociação com os
EUA. Funciona?
Na área empresarial, a resposta
é claramente não. Sandra Rios, especialista em comércio internacional da CNI (Confederação Nacional da Indústria), não vê "comunhão de interesses abrangente" entre países andinos e o Brasil/Mercosul.
Cita o caso da Colômbia, que
tem agenda bem diferente da brasileira em matéria de serviços e investimentos, por exemplo, dois
dos itens que compõem a pauta
de negociações da Alca.
Roberto Teixeira da Costa conta
que, em reunião promovida pelo
Ceal (Conselho de Empresários
da América Latina), a ministra colombiana da Defesa, Marta Lucía
Ramírez, foi muito clara ao dizer
que o destino colombiano "está
mais que nunca ligado aos EUA".
Conclusão de Teixeira da Costa:
"Entre olhar para o Norte ou para
o Sul, esses países todos vão olhar
para o Norte, na expectativa de
obter melhores resultados".
Reforça Peter Hakim, presidente do "Diálogo Interamericano",
centro de estudos com base em
Washington: "Os EUA são o
grande mercado ao qual os exportadores latino-americanos querem ter acesso e são, de longe, a
maior fonte potencial de investimento e de novas tecnologias".
Questões domésticas
Hakim não acredita nem mesmo na hipótese de que uma América do Sul unida possa ter mais
força na negociação com Washington: "Qualquer concessão
que os Estados Unidos farão nas
negociações regionais estarão limitadas por questões domésticas
e pelas negociações globais paralelas. Tais limitações não mudarão por causa da integração regional. Além disso, é improvável que
os EUA façam mais concessões a
uma América do Sul integrada do
que ao Brasil sozinho".
Brad Setser (Council on Foreign
Relations) segue mais ou menos a
mesma trilha: "Uma posição negociadora comum de todos os
países sul-americanos poderia
fortalecer a liderança regional
brasileira, mas suspeito que o
Brasil é grande o suficiente para
ter peso negociador substancial
por si próprio frente aos EUA".
Fecha o círculo Gary Clyde Hufbauer, do IIE (Instituto para a
Economia Internacional, também
com sede em Washington), um
dos maiores especialistas em comércio global.
Para ele, a integração sul-americana só fortaleceria a posição do
Sul nas negociações com os EUA
se "os países sul-americanos falassem com uma só voz, como o
faz a União Européia em negociações comerciais globais. Acho que
há um longo caminho para chegar a isso", diz Hufbauer.
Há até quem veja o risco de que
a integração enfraqueça, em vez
de fortalecer, o Brasil e o Mercosul. Caso de Alfredo Valladão
(Instituto de Estudos Políticos de
Paris): para ele, o atrativo do Mercosul é o fato de representar um
pólo de estabilidade democrática
na América do Sul. "Mesclar-se a
Chávez, Colômbia, Equador e Peru significa importar toda essa
instabilidade", completa.
(CR)
Texto Anterior: Acordo quer tornar região 4º pólo mundial Próximo Texto: Multinacionais apóiam projeto de integração Índice
|