|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TRIBUTÁRIA
Na fase de detalhamento, propostas genéricas podem se transformar em novas alíquotas e regras de cobrança
Sem perdedores, reforma pode elevar carga de impostos
GUSTAVO PATÚ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Para quem acredita na capacidade dos economistas de calcular
com precisão milimétrica o impacto das medidas que prescrevem, a reforma tributária do governo Luiz Inácio Lula da Silva foi
desenhada para que União, Estados e municípios mantenham
exatamente a receita hoje obtida
com impostos.
Para quem viu o ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) ser
aplaudido por prefeitos e costurar
um rápido consenso entre os 27
governadores em torno da reforma, a impressão é que risco de
perda, de fato, não há.
E, finalmente, para quem observa a penúria orçamentária nacional, o temor é que, na fase de detalhamento, quando as propostas
genéricas se transformam em novas alíquotas e regras de cobrança, o resultado final do projeto seja um novo aumento da carga tributária brasileira.
Nos últimos dez anos, essa carga (a fatia da renda nacional destinada a impostos, contribuições e
taxas diversas) subiu de 25% para
algo como 35% do Produto Interno Bruto, uma proporção elevada
para um país de renda média
-na Argentina, por exemplo, o
percentual fica na casa dos 20%.
O ministro Palocci, o arquiteto
da reforma, argumenta que não
faz sentido falar em uma carga
ideal. "Quem define isso é a sociedade", afirma.
Segundo ele, na presente conjuntura de crise fiscal, cujo sinal
mais óbvio é uma dívida pública
equivalente a 55% do PIB (Produto Interno Bruto, soma de todas
as riquezas do país), é impossível
reduzir a arrecadação.
Resta, afirma, "melhorar a qualidade dos impostos". Daí as propostas de simplificar a legislação
do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços),
eliminar a incidência da Cofins
em todas as etapas do setor produtivo, reduzir a contribuição
previdenciária patronal sobre a
folha de salários e criar alíquotas
progressivas para o imposto sobre a herança.
Olho no caixa
Esse pacote é embalado por um
discurso de estímulo à produção e
às exportações (com as mudanças
no ICMS e na Cofins), geração de
empregos (com a desoneração da
folha de pagamentos) e justiça social (com menos ICMS sobre a
cesta básica e mais tributação sobre o patrimônio).
Na vida prática, porém, governos federal, estaduais e municipais acompanham o projeto de olho no caixa. O exemplo mais
claro, normalmente omitido na
retórica em defesa da reforma, é
que Lula também propõe a transformação da CPMF numa contribuição permanente.
Capaz de arrecadar mais de R$
20 bilhões anuais quase sem margem de sonegação, a CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira) é um tributo cumulativo e regressivo -incide sobre todas as etapas do setor
produtivo e aplica a mesma alíquota a qualquer valor.
É o oposto do que a reforma
considera imposto de boa qualidade. Pela legislação atual, a
CPMF terá alíquota simbólica em
2004, seu último ano de vigência.
Pela reforma proposta, terá alíquota reduzida, mas é definido o
cronograma para a redução.
Estados
Os Estados também esperam
arrecadar mais com o novo ICMS,
ou IVA (Imposto sobre Valor
Agregado), cuja receita continuará sendo repartida com os municípios. A própria Fazenda espera
um aumento de 10% sobre os cerca de R$ 100 bilhões anuais arrecadados hoje com o imposto.
Argumenta-se que o ganho decorrerá de mais eficiência e menos sonegação -mas, enfim, a carga subirá.
Há pela frente uma complicada
negociação sobre as alíquotas do
novo ICMS, que deverão ser uniformes por tipo de produto em
todo o país. Assim, uma mercadoria que hoje sofre tributação de
30% num Estado, 25% em outro e
20% num terceiro, passará a uma
mesma alíquota. Se nenhum dos
três Estados pode perder, qual será a alíquota escolhida?
Texto Anterior: Reformas: Oposição cobrará caro para apoiar as propostas Próximo Texto: Proposta do governo é superficial, dizem indústria e serviços Índice
|